Transtornos Alimentares: o que Nutricionistas precisam saber?

Transtornos alimentares são uma realidade da vida contemporânea. Mesmo com as baixas prevalências observadas na população geral, este conjunto particular […]


Transtornos alimentares são uma realidade da vida contemporânea. Mesmo com as baixas prevalências observadas na população geral, este conjunto particular de quadros psiquiátricos precisam de grande atenção dos profissionais por sua difícil identificação, diversas consequências adversas para o corpo e a mente, diminuição significativa de qualidade de vida e alto risco de morte – inclusive, suicídio.

Embora muitos possam pensar que os transtornos alimentares, como anorexia, bulimia e compulsão alimentar, são apenas preocupações relacionadas à imagem corporal e alimentação, a realidade vai além.

Neste contexto, os nutricionistas são peças fundamentais e precisam não só ter conhecimento sobre o tema, mas também saber qual é o seu papel no tratamento e prevenção.

Mas o que são transtornos alimentares?

Transtornos alimentares são síndromes comportamentais que envolvem um sofrimento mental e psicológico com relação a questões ligada a comida e corpo – são descritos como transtornos e não como doença, uma vez que não é possível estabelecer uma origem exata comum em todos os casos (etiopatogenia).

O tratamento e o manejo de transtornos alimentares exigem uma equipe multiprofissional, que deve incluir também um nutricionista com especialização na área.  

Todavia, todos os profissionais com graduação em nutrição trabalham – conscientemente ou não – na prevenção ou promoção de transtornos alimentares em todos os seus atendimentos, falas e posicionamentos, uma vez que são figuras de confiança para a população leiga em relação a alimentação (e o comportamento alimentar) e podem influenciar positivamente e negativamente a relação de um indivíduo com a comida (sim, é muito responsabilidade mesmo).

Quais são os transtornos alimentares e quais os critérios diagnósticos?

Avaliar e diagnosticar um transtorno alimentar, por ser um quadro psiquiátrico, não está entre as atividades que um nutricionista pode executar – sendo esta reservada ao médico psiquiatra. Entretanto, mesmo longe deste ramo de trabalho, um nutricionista precisa estar sempre atento aos sinais e sintomas que se relacionam aos transtornos alimentares para poder encaminhar o paciente para uma equipe especializada quando necessário.

Anorexia Nervosa

A anorexia nervosa é caracterizada por uma restrição persistente da ingestão de alimentos, resultando em um peso corporal significativamente abaixo do normal para a idade e altura da pessoa, juntamente com um medo intenso de ganhar peso ou de se tornar gordo e uma perturbação na forma de vivenciar o peso, tamanho ou forma corporal.

Além disso, mas não obrigatoriamente, indivíduos com anorexia nervosa também podem apresentar episódios de comer compulsivo, purgação e outras formas de compensação da alimentação.

A restrição alimentar extrema e a falta de ingestão adequada de nutrientes podem levar a uma série de problemas de saúde que afeta o adequado funcionamento de órgãos vitais, incluindo: complicações cardíacas, já que a desnutrição pode causar irregularidades no ritmo cardíaco e pressão arterial baixa; problemas gastrointestinais, quando a restrição alimentar resulta em constipação e inchaço abdominal; desequilíbrios eletrolíticos, especialmente quando a anorexia nervosa está associada a purgação; comprometimento do sistema imunológico; maior risco para osteoporose e fraturas.

Concomitantemente, a anorexia nervosa está associada a altos níveis de ansiedade, depressão e pensamentos suicidas.  

Revisões apontam que entre 20% e 40% das mortes de pacientes com anorexia nervosa é resultado de suicídio, números que tornam possível afirmar que este grupo apresenta 23 vezes mais risco de tentar se suicidar do que a população geral.

Bulimia Nervosa

Para ser caracterizado como bulimia nervosa, os comportamentos do paciente devem incluir um comer compulsivo regular em conjunto com comportamentos compensatórios recorrentes (no mínimo uma vez por semana, por três meses consecutivos), além disso é necessário que o paciente possua uma autoavaliação indevidamente influenciada pela forma e peso.

Os comportamentos compensatórios podem incluir (sem se limitar):

  • Vômitos autoinduzidos,
  • Uso indiscriminado de substâncias laxativas,
  • Exercícios excessivos
  • Jejuns prolongados.

Vômitos frequentes e uso de laxantes podem levar a desidratação, desequilíbrios eletrolíticos perigosos, danos no esôfago e na garganta, problemas dentários, inchaço e outros problemas gastrointestinais.

A vergonha e a culpa associadas à bulimia podem levar ao isolamento social e à dificuldade em manter relacionamentos interpessoais saudáveis, o que intensifica o risco de depressão e ideação suicida.

Comparativamente, pacientes com bulimia nervosa apresentam mais tentativas de suicidio do que aqueles com anorexia nervosa, entretanto, dada a fragilidade característica da anorexia nervosa, o sucesso é mais frequente neste grupo.

Transtorno da Compulsão Alimentar

Episódios recorrentes de compulsão alimentar, onde o indivíduo ingere uma quantidade excessiva de comida em um curto período de tempo e sente uma sensação de falta de controle caracterizam o Transtorno da compulsão alimentar. No entanto, ao contrário da bulimia nervosa, esses indivíduos não se envolvem em comportamentos compensatórios.

Para ser diagnosticado como tal, o comer compulsivo deve conter ao menos três destas características:

  • Comer mais rápido que o normal;
  • Comer até se sentir desconfortavelmente cheio;
  • Comer muito, mesmo sem fome;
  • Comer sozinho, por vergonha;
  • Sentir culpa na sequência.

A ingestão excessiva de calorias durante os episódios de compulsão alimentar frequentemente eleva o risco para o desenvolvimento de diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares e hipertensão.

Sentimentos de culpa, vergonha e remorso após os episódios de compulsão alimentar podem contribuir para problemas emocionais, como ansiedade e depressão e ainda levar ao isolamento social e à evitação de situações sociais que envolvem comida – afetando negativamente a qualidade de vida.

Dada ao grande número de informações equivocadas sobre “alimentação saudável” em circulação, cabe ressaltar que a ingestão excessiva de calorias deve ser realmente excessiva e estar distante do que uma pessoa em situações cotidianas consiga ingerir.

Existem ainda outros transtornos alimentares que podem envolver regurgitação, consumo de substâncias não reconhecidas como alimento e falta de interesse em comer não relacionada ao peso e imagem corporal.

Nota-se que existem critérios muito claros e específicos para os transtornos alimentares, mas que não necessariamente serão sempre expressos desta forma e com estas frequências nos pacientes – sendo então papel do profissional identificar os nuances e, para os médicos, até mesmo diagnosticar o quadro encontrado como “outro transtorno alimentar especificado”.

Aos nutricionistas, cabe reconhecer os sinais de alerta de transtornos alimentares e estar preparado para agir com sensibilidade.  

O estigma em torno dos transtornos alimentares ainda persiste, o que pode dificultar a busca de ajuda por parte dos pacientes. É crucial lembrar que a compaixão e o respeito pelo paciente são essenciais para criar um ambiente de tratamento seguro e eficaz.

Não se trata apenas de comida, mas também de cuidado e compreensão em seu sentido mais amplo.

Referências Bibliográficas

  • Alvarenga, MS, Dunker KLL, Philippi ST. Transtornos alimentares e nutrição: da prevenção ao tratamento.Editora Manole, 2019.
  • American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Fifth Edition (DSM-5). Arlington: American Psychiatric Publishing; 2013.
  • Hiluy J, Nunes FT, Pedrosa MAA, Appolinário JCB. Os transtornos alimentares nos sistemas classificatórios atuais: DSM-5 e CID-11. Debates em Psiquiatria. 2019.
  • Veras JLA, Ximenes RCC, Vasconselos FMN, et al. Relationship between suicidal behavior and eating disorders: a systematic review. Rev Fund Care Online. 2018 jan./mar.; 10(1):289-294.
  • World Health Organization (WHO). ICD-11 for Mortality and Morbidity Statistics (ICD-11 MMS) 2018.
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