Exames Laboratoriais na Nutrição: As vitaminas do Complexo B

A história do que hoje conhecemos como vitaminas do complexo B se entrelaça com a história da própria nutrição e […]


A história do que hoje conhecemos como vitaminas do complexo B se entrelaça com a história da própria nutrição e teve início nas observações de um médico holandês.  

Em 1889, Christiaan Eijkman desvendou um elo entre a alimentação e o beribéri, uma doença até então misteriosa, ao observar os diferentes tipos de arroz oferecidos a animais em cativeiro e os sintomas que eles provocavam. Anos mais tarde, em 1906, um bioquímico inglês, Frederick Gowland Hopkins, descreve a hipótese de que além das proteínas, gorduras e carboidratos, existiam “fatores alimentares acessórios” essenciais à saúde, lançando as bases para o conceito atual de vitaminas.  

Casimir Funk, um bioquímico polonês atuando em Londres em 1911, levou essa ideia adiante, cunhando o termo “vitaminas” para descrever essas substâncias orgânicas cruciais, numa fusão das palavras “vital” e “amina”.  

Embora mais tarde se descobrisse que nem todas as vitaminas continham aminas, o nome perdurou, solidificando-se na linguagem científica. 

Em 1913, Elmer McCollum, um bioquímico da Universidade de Wisconsin, distinguiu duas categorias distintas desses nutrientes essenciais, nomeando-as de forma pragmática como “fator solúvel em gordura A” e “fator solúvel em água B”. O clímax desta narrativa científica ocorreu em 1926, quando os químicos holandeses Barend Jansen e Willem Donath isolaram cristais do fator “anti-beribéri” do arroz integral, um momento que não apenas validou as teorias de Hopkins e Funk, mas também marcou a primeira vitamina a ser isolada: a vitamina B1, ou tiamina. 

Desafios significativos marcaram a ciência a partir deste ponto, especialmente no que diz respeito à classificação e nomenclatura. As descobertas de que o que era considerado uma única vitamina era, na verdade, um grupo de nutrientes distintos, exigiu uma revisão dos textos publicados e uma nova estrutura de nomenclatura para diferenciar cada componente.  

Neste meio do caminho, muitas substâncias foram “desclassificadas”, como as originais vitaminas B4 (adenina), B8 (inositol), B10 (ácido para-aminobenzóico), B11 (salicina), e B13 (ácido orótico) – uma vez que não atendiam os critérios necessários para serem denominadas como vitaminas, ou faziam parte de outro grupo de substâncias. 

Hoje, oito vitaminas compõe o chamado “complexo B” (veja quadro a seguir) e mais do que saber apenas as fontes de cada uma delas, os nutricionistas precisam saber quando pode ser interessante investigar a fundo os níveis séricos de cada paciente para que as orientações nutricionais sejam, de fato, personalizadas e focadas no bem-estar dos indivíduos.  

Garantida pela Lei No 8.234 de 1991, a solicitação destes exames pode ser feita pelos nutricionistas – mas reforça-se que os valores de referências do quadro podem variar conforme o laboratório e é crucial interpretá-los no contexto clínico individual de cada paciente. 

VITAMINAQUANDO PEDIR?COMO JUSTIFICAR?VALORES DE REFERÊNCIAOBSERVAÇÕES 
Vitamina B1TiaminaMudanças percebidas no comportamento, sintomas oculares, dificuldades na locomoção, estados de confusão mental, encefalopatia, baixo peso, uso de insulina e alcoolismo. Avaliar a possibilidade de beribéri e para acompanhar as consequências do consumo prolongado de álcool. 70-80 nmol/L A tiamina está presente em maiores concentrações em alimentos como levedura, verduras, carne de porco, arroz e cereais. A exposição a valores elevados de pH e altas temperaturas pode causar desnaturação da molécula de tiamina, resultando na sua degradação durante processos culinários como cozimento, assim como durante a pasteurização. 
Vitamina B2 Riboflavina Anorexia nervosa, intolerância à lactose, síndrome do intestino curto, uso de barbitúricos (medicamentos usuais para insônia e convulsões). Detecção de deficiência de riboflavina. 3-15 µg/L Jejum é fundamental no momento do exame. 
Vitamina B3 Niacina Dermatite, diarreia, dislipidemia. Avaliar a possibilidade de pelagra e monitoramento de dislipidemia. Niacina:
< 5 ng/mL 
Nicotinamida: 5-48 ng/mL 
Existem evidências que a suplementação de niacina pode reduzir em até 25% o colesterol total. 
Vitamina B5 Ácido Pantotênico Rara necessidade, exceto em casos graves de desnutrição. Detecção de deficiência de Vitamina B5, dado quadro de desnutrição. 17-43 ng/mL Sintomas de deficiência são raros, mas podem incluir fadiga, insônia, depressão, irritabilidade e vômito. 
Vitamina B6 Piridoxina Alcoolismo, asma, gestação, desnutrição. Detecção de deficiência de Vitamina B6. 5-50 µg/L Existem evidências de toxicidade grave em suplementações superiores a 2g/dia. 
Vitamina B7 Biotina Conjuntivite, convulsão, infecções de pele, náuseas, vômitos e atraso no desenvolvimento (crianças). Detecção de deficiência de biotina. 200-1200 ng/L Apesar da comum indicação para queda de cabelo e fortalecimento de unhas, as evidências sobre o uso da suplementação para este fim são insuficientes para a adoção na prática clínica. 
Vitamina B9 Ácido Fólico Anemia, alcoolismo, gestação, doença celíaca, vegetarianos. Avaliação do status de folato. Folato sérico: > 6,5 ng/ml Folato eritrocitário: 280-900 ng/ml Suplementação recomendada durante a gravidez. Dietas vegetarianas podem induzir um aumento indesejado do folato sérico. 
Vitamina B12 Cobalamina Veganos, vegetarianos, idosos e indivíduos com alto consumo álcool. Identificação de deficiência, que pode levar a complicações neurológicas e hematológicas. Valores de referência: 180 a 914 pg/ml Faixa indeterminada: 145 a 180 pg/ml Faixa deficiente: < 145 pg/ml O uso de certos medicamentos pode afetar a absorção desta vitamina. 

Saiba mais sobre interpretação de exames: 

Artigo: Exames laboratoriais na nutrição: quando pedir e como interpretar a dosagemde vitaminas e minerais?

Artigo: Exames laboratoriais na nutrição: quando pedir e como interpretar a dosagem de vitaminas e minerais?

Referências bibliográficas 

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