A velocidade do envelhecimento populacional assusta qualquer um que parar para pensar nas consequências deste fato e no quão despreparados podemos estar, como profissionais de saúde.
Segundo o IBGE, entre 2012 e 2021 houve um aumento de cerca de 40% das pessoas com mais de 60 anos, passando de 22 milhões para 31 milhões de idosos brasileiros, número que representa aproximadamente 15% da população total (IBGE, 2022).
Tal fato não só aumenta a chance de um idoso precisar de um atendimento nutricional, mas também do nutricionista estar inserido em um ambiente em que, necessariamente, conviverá com mais idosos – e, assim, também será responsável por eles, não só como profissional de saúde, mas também como cidadão.
Isto porque segundo o Art. 3º do Estatuto do Idoso “é obrigação (…) da comunidade, da sociedade (…) assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação (…)” (Brasil, 2003).
E, neste contexto, atentar-se e combater a monotonia alimentar pode ser a forma mais simples de garantir o direito à saúde e à alimentação deste público mais vulnerável.
Em linhas gerais, a monotonia alimentar em idosos refere-se a uma condição em que a alimentação de uma pessoa idosa é repetitiva e limitada em variedade de alimentos. Condição que está diretamente relacionada com alterações no comportamento alimentar, por questões biológicas, psicológicas e sociais – inerentes ao envelhecimento:
- A capacidade de mastigação reduz com o avançar da idade, o que pode limitar significativamente o padrão dos alimentos a serem consumidos;
- Do mesmo modo, as naturais reduções do paladar, junto com a menor salivação, contribuem para a redução do prazer ao se alimentar – influenciando nas motivações para comer e, consequentemente, reduzindo a percepção da necessidade de variar a alimentação;
- Redução generalizada da força, que influenciará diretamente na capacidade de comprar, transportar e preparar alimentos.
- Declínios cognitivos, a depender do grau, podem influenciar não só na capacidade de preparar as refeições, mas também de aceitá-las e degluti-las;
- Redução na renda, comum no momento da aposentadoria, também contribui para a redução da variedade dos alimentos a disposição;
- A perda de um cônjuge terá impacto significativo nas refeições, seja para o homem que, culturalmente, perde a figura que por muito tempo preparava seu alimento, e para a mulher que pode não ver mais sentido em cozinhar “apenas para si” (vale ressaltar que, ainda que as gerações atuais estejam quebrando e refutando estes padrões, na população idosa dos dias de hoje, ainda se mantém essas relações e papéis sociais tradicionais).
Estes são apenas alguns dos principais fatores que podem influenciar na alimentação de uma pessoa idosa, que – para uma atuação ampla e responsável – precisam ser considerados pelo nutricionista e até mesmo observados em idosos próximos, como vizinhos e familiares.
MAS COMO PROCEDER?
Exames de sangue com os principais parâmetros bioquímicos serão fundamentais para direcionar algumas orientações, mas, sozinhos, terão pouca capacidade de motivar mudanças neste grupo etário (assim como em qualquer outro).
Porém, da mesma forma que se preservam nesta população valores tradicionais relacionados aos papéis do homem e da mulher, também se mantém uma tradição de alimentação e relação com a comida muito mais saudável do que a das gerações atuais, e trabalhar este resgate dos conhecimentos dos próprios idosos é o melhor caminho para tirá-lo da monotonia alimentar.
Além disso, alguns estudos já colocam a capacidade de preparar refeições como um fator de proteção no envelhecimento (Santos e Ribeiro, 2011; Chen et al., 2012), deixando ainda mais clara a necessidade de trabalhar a proximidade das pessoas com o próprio alimento – o que neste caso também significa trabalhar a independência e autonomia.
Conheça seu paciente | Aprofunde-se no passado do indivíduo, conheça suas preferências alimentares e suas memórias afetivas relacionadas a alimentação. Use estes “trunfos” na hora de fazer um plano alimentar junto com ele. |
Mapeie a região | Investigue o ambiente alimentar a disposição do paciente, a distância da casa dele até o mercado ou a feira influenciará diretamente nas suas recomendações. |
Encontre suportes | Antes de recomendar quilos e mais quilos de frutas e vegetais, veja como isto será operacionalizado no cotidiano. Quem compra? Quem leva? Com qual frequência? |
Estimule a culinária | Em muitos casos este estímulo pode ser muito desafiador, principalmente quando o prazer em comer já está escasso. Nesses casos, não force discursos batidos sobre autoestima, mas encontre alternativas externas que podem ajudar (como cozinhar para os netos ou amigos) |
Incentive as refeições em grupo | O momento das refeições é fundamental para determinar a variedade e quantidade dos alimentos ingeridos. Entenda o contexto familiar e encontre formas simpáticas de sugerir mais refeições em família. |
Conheça seu paciente Aprofunde-se no passado do indivíduo, conheça suas preferências alimentares e suas memórias afetivas relacionadas a alimentação. Use estes “trunfos” na hora de fazer um plano alimentar junto com ele.
Mapeie a região Investigue o ambiente alimentar a disposição do paciente, a distância da casa dele até o mercado ou a feira influenciará diretamente nas suas recomendações.
Encontre suportes Antes de recomendar quilos e mais quilos de frutas e vegetais, veja como isto será operacionalizado no cotidiano. Quem compra? Quem leva? Com qual frequência?
Estimule a culinária Em muitos casos este estímulo pode ser muito desafiador, principalmente quando o prazer em comer já está escasso. Nesses casos, não force discursos batidos sobre autoestima, mas encontre alternativas externas que podem ajudar (como cozinhar para os netos ou amigos)
Incentive as refeições em grupo O momento das refeições é fundamental para determinar a variedade e quantidade dos alimentos ingeridos. Entenda o contexto familiar e encontre formas simpáticas de sugerir mais refeições em família.
Posturas muito rígidas (por exemplo: “eu mandei, você que não fez”), além de serem bastante ineficazes, também não deixam de ser uma forma de abuso e negligência contra os idosos – uma vez que se reconhece a responsabilidade social (e legal) de suporte.
Sendo que um olhar global no momento do atendimento nutricional será a chave para o sucesso das recomendações, especialmente com este público.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
- Alves LMT, Dantas RO. Percepção de sabores em pessoas normais. GED gastroenterol endosc dig. 2014;33(3):102-5.
- Amarya S, Singh, K, Sabharwal, M. Changes during aging and their association with malnutrition. J Clin Gerontol Geriatr. 2015; 6(3): 78–84.
- Brasil. Estatuto do idoso: lei federal nº 10.741, de 01 de outubro de 2003. Brasília, DF: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2004.
- Chen LC, Lee M, Chang Y, Wahlqvist ML. Cooking frequency may enhance survival in Taiwanese elderly. Pub Health Nutr. 2012;15(7):1142-9.
- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Pesquisa Nacional de Saúde (PNAD contínua: 2020-2021). Brasília; 2022.
- Leslie W, Hankey C. Aging, nutritional status and health. Healthcare. 2015; 3(3):648-58.
- Mojet J, Christ-Hazelhof E, Heidema J. Taste perception with age: generic or specific losses in threshold sensitivity to the five basic tastes? Chem Senses. 2001;26(7):841-60.
- Pilgrim AL, Robinson SM, Sayer AA, Roberts HC. An overview of appetite decline in older people. Nurs. Older People. 2015; 27(5): 29–35.
- Santos GD, Ribeiro SML. Aspectos afetivos relacionados ao comportamento alimentar dos idosos frequentadores de um Centro de Convivência. Rev Bras Geriat Gerontol. 2011;14(2):319-28.
- Ship JA. The influence of aging on oral health and consequences for taste and smell, Physiol. Behav. 1999; 66(2): 209-15.
- Sinchen U, Koebnick C, Hoyer S, Issanchou S, Zunft HJF. Odour and taste sensitivity is associated with body weight and extent of misreporting of body weight. Eur J Clin Nutr. 2006;60(6):698-705.
- Yannakoulia M, Mamalaki E, Anastasiou CA, Mourtzi N, Lambrinoudaki I, Scarmeas N. Eating habits and behaviors of older people: Where are we now and where should we go? Maturitas. 2018;114: 14-21.
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