Como o efeito sanfona atrapalha o emagrecimento?

O efeito sanfona, conhecido em inglês como weight cycling, refere-se ao processo de perder e recuperar peso repetidamente. Tal flutuação […]


O efeito sanfona, conhecido em inglês como weight cycling, refere-se ao processo de perder e recuperar peso repetidamente. Tal flutuação de peso frequentemente é resultado do desejo de atingir padrões estéticos corporais, ao comparar-se socialmente de maneira desfavorável e ao sofrer preconceito por conta do peso.  

Este padrão repetitivo de tentar emagrecer é uma realidade recorrente na vida de muitas pessoas que se submetem constantemente a dietas restritivas. Tal situação é bem familiar para os nutricionistas, que estão na linha de frente para compreender as dinâmicas por trás dessas flutuações de peso e desenvolver métodos eficazes que auxiliem seus clientes/pacientes a superar o desafio do efeito sanfona, visando a manutenção da saúde. 

Qual é o mecanismo do efeito sanfona? 

Estudos observacionais em várias popula��ões já estabeleceram diversas consequências negativas do efeito sanfona para a saúde (veja a seguir), todavia o entendimento dos mecanismos por trás deste acontecimento carece de estudos em humanos.  

Porém, uma recente pesquisa com testes controlados em animais sugere que após a perda de peso, as alterações ocasionadas nas células imunes do tecido adiposo por conta do excesso de peso prévio permanecem – especificamente as células responsáveis pela expressão gênica do estado inflamatório da obesidade permaneceram nos animais que perderam peso até o final do período de estudo (24 semanas após a redução de peso). Os pesquisadores afirmam que esses resultados reforçaram a ideia de que a memória imune inata induzida pela obesidade não é específica e prepara as células imunes para uma resposta inflamatória geral, mesmo em outros tecidos – como o fígado e o pâncreas.  

Esses dados dão um vislumbre do possível mecanismo metabólico da facilidade de reganho de peso, já que a memória imunológica pode ser um fator que contribui para mecanismos compensat��rios do balanço energético

Concomitantemente a esses processos metabólicos da perda de peso, é necessário considerar os aspectos comportamentais – já que frequentemente essas consequências emergem de estratégias insustentáveis para a perda de peso a longo prazo, como restringir a alimentação de forma extrema, inclusive omitindo categorias inteiras de alimentos, e engajar-se em rotinas de exercícios físicos excessivamente rigorosas e, até mesmo, “punitivas”.  

Por serem difíceis de manter, essa variação entre restrição e abundância de alimentos (comumente exagerada após episódios de privação de ingestão energética) causa ainda uma desregulação hormonal dos controles de fome e saciedade, o que favorecerá ainda mais o reganho de peso.  

Quais as consequências do efeito sanfona? 

Assim como seus mecanismos, os resultados da dificuldade de manter um peso estável abrangem tanto consequências metabólicas quanto comportamentais: 

  • Um estudo randomizado realizado pela Faculdade de Medicina de Nova York com 9500 participantes identificou um risco 136% de ter um infarto entre os pacientes com doenças cardiovasculares que apresentavam flutuação de peso; 
  • O Centro de Pesquisa em Diabetes de Harvard encontrou em um estudo observacional com 1000 indivíduos um risco 30% maior de desenvolver diabetes mellitus tipo 2 em indivíduos com variação de peso (apenas 2 kg) constante em 6 meses de estudo. 
  • No mesmo sentido, uma coorte sul-coreana que acompanhou quase 5000 mil indivíduos (saudáveis na seleção) ao longo de 4 anos, identificou na flutuação de peso um risco 86% maior de desenvolver diabetes mellitus tipo 2. 
  • A American Heart Association, em um estudo com 430 mulheres, encontrou um risco cardiovascular aumentado naquelas que perderam e reganharam até 4,5 kg em um ano. 
  • Uma coorte alemã que acompanhou 1160 homens com mais de 40 anos ao longo de 15 anos encontrou como único fator de risco significante para a morte a flutuação de peso – risco 86% maior, após ajuste para doenças cardiovasculares e diabetes mellitus. 
  • Um estudo da Universidade de Connecticut, com 2700 participantes, encontrou uma associação significativa da flutuação de peso decorrente de tentativas intencionais de perder peso com sintomas depressivos (risco 15% maior de desenvolver os sintomas). Os pesquisadores ainda verificaram o que mediou este efeito, e encontraram que o estigma com o peso colaborou para esta relação. 

Como enfrentar o efeito sanfona? 

Em uma revisão sobre o tema, pesquisadoras do Departamento de Psicologia da Universidade da Carolina do Norte sugerem incluir a manutenção do efeito sanfona a longo prazo como um transtorno alimentar, a fim de aumentar a conscientização do público e profissionais sobre a gravidade deste fenômeno contemporâneo.  

Mas independentemente de qualquer classificação, o que é necessário fazer, na prática, é ampliar a atuação do nutricionista para a compreensão dos comportamentos. Tal como as evidências mostram, intervenções que focam exclusivamente em resultados de perda de peso tendem não só a falhar, como contribuir para uma piora do quadro geral.  

Dessa forma, voltar as atenções para a mudança de comportamentos não saudáveis é a opção que trará mais benefícios para a saúde dos pacientes, inclusive com a diminuição do peso corporal – que será mais demorada do que aquela causada por abruptas restrições calóricas, mas certamente será duradoura.  

Referências Bibligográficas

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2 respostas para “Como o efeito sanfona atrapalha o emagrecimento?”

  1. Ameliasachilombo

    Conteúdo excelente

    1. Academia da Nutrição Team

      Ficamos felizes com o seu feedback! 🙂

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