Festa do chá: afinal, algum deles ajuda a emagrecer?

Hoje, a urgência por resultados imediatos na perda de peso tem impulsionado a procura por soluções rápidas e sem embasamento, […]


Hoje, a urgência por resultados imediatos na perda de peso tem impulsionado a procura por soluções rápidas e sem embasamento, entre eles, o uso de chás com promessas de emagrecimento acelerado. Mas ainda que suas origens antiquíssimas residam em utilizações terapêuticas, os chás não são capazes de “queimar a gordura” de absolutamente ninguém – e é preciso saber falar com propriedade sobre isso, uma vez que será um tema recorrente em atendimentos nutricionais (especialmente em primeiros contatos). A informação precisa e bem fundamentada surge como uma aliada essencial na orientação de comportamentos saudáveis, especialmente no combate a crenças tão enraizadas no conhecimento popular. 

Para compreender as razões pelas quais os chás não representam estratégias eficazes de emagrecimento, é essencial reconhecer que, em termos gerais, eles podem apresentam propriedades diuréticas, laxativas ou até mesmo “termogênicas”. Estas características, embora possam influenciar temporariamente o peso corporal, principalmente através da perda de líquidos, não induzem a uma queima efetiva de gordura corporal – tampouco uma manutenção do novo peso a longo prazo. Entenda: 

Chás diuréticos

Chá verde, chá de hibisco, chá de dente de leão, chá de carqueja, chá de cavalinha 

O efeito diurético de certos chás está relacionado à sua capacidade de aumentar a produção de urina pelo corpo. Este mecanismo ocorre quando os compostos presentes nos chás estimulam os rins a excretar mais água e eletrólitos (como sódio e potássio) do que o normal. 

Em condições normais, os rins filtram o sangue, removendo resíduos e substâncias extras, que são excretados na urina. Os chás diuréticos contêm substâncias que alteram essa função renal, aumentando a quantidade de água e sais minerais eliminados. Isso pode ocorrer através da redução da reabsorção de água nos túbulos renais ou do aumento da excreção de sódio, o que leva a um aumento do volume de urina. 

No entanto, o uso prolongado e excessivo de chás diuréticos pode levar a desequilíbrios eletrolíticos e desidratação, pois a perda excessiva de água e minerais importantes pode afetar negativamente várias funções corporais. A desidratação pode causar sintomas como tontura, fadiga e problemas renais a longo prazo. Além disso, a perda de eletrólitos como o potássio pode levar a problemas cardíacos e musculares. 

Embora o efeito diurético possa resultar em perda de peso imediata, é importante destacar que essa perda é predominantemente de água, e não de gordura corporal. Portanto, o uso de chás diuréticos como estratégia de emagrecimento não é eficaz a longo prazo e pode ser prejudicial à saúde. 

Chás laxativos

Chá de sene, Chá de cascara sagrada, Chá de ruibarbo 

O efeito laxativo de alguns chás está ligado à sua capacidade de estimular o sistema digestivo, particularmente o intestino grosso, para promover a evacuação. Esse efeito é alcançado através de diferentes mecanismos, dependendo dos compostos ativos presentes no chá. 

Alguns chás contêm substâncias que aumentam a motilidade intestinal, ou seja, a contração dos músculos do intestino, o que ajuda a mover o conteúdo intestinal em direção ao reto. Já outros funcionam como agentes formadores de volume, retendo água no intestino. Isso aumenta o volume e a umidade das fezes, facilitando sua passagem. Há também alguns chás que possuem compostos que agem de forma osmótica, atraindo água para o intestino, o que ajuda a amolecer as fezes e estimular o movimento intestinal. 

O uso frequente e a longo prazo de chás laxativos pode fazer o intestino deixar de funcionar adequadamente sem o estímulo externo. Além disso, desequilíbrios eletrolíticos podem acontecer, especialmente a perda de potássio, o que pode afetar o funcionamento cardíaco e muscular. Adicionalmente, o risco de desidratação e alterações na microbiota intestinal são inevitáveis, o que pode impactar negativamente a saúde digestiva e a absorção de nutrientes

Chás “termogênicos”

Chá verde, chá de gengibre, chá preto, chá mate, chá de canela 

A termogênese é um processo metabólico no qual produz-se calor a partir de energia. Felizmente, não é possível induzir o organismo a direcionar a energia ingerida para um processo de termogênese – nem por meio de chás, ou de outros suplementos – já que esse processo impediria o funcionamento adequado do metabolismo e poderia levar a morte. Assim, conceitualmente, não existem nem chás, nem suplementos, com propriedade termogênica – em seu sentido metabólico. 

Entretanto, no Brasil, usa-se de forma indiscriminada tal termo para se referir a substâncias que alegam apresentar propriedades “fat burners” (queimadoras de gordura), por serem capazes de aumentar a taxa metabólica. A cafeína, presente em diversos chás, é a principal destas substâncias. Todavia, mesmo com tal propriedade descrita, esse mecanismo de ação não viabiliza uma perda de peso perceptível de forma isolada. 

Riscos importantes

Além dos diversos efeitos adversos já descritos em cada mecanismo de ação, o uso dos chás com o propósito de modular o peso corporal pode trazer riscos de hepatotoxicidade, dado a um consumo exagerado de tais substâncias. Em 2022, o caso de uma enfermeira que teve falência hepática fatal pelo abuso de uma combinação de ervas ganhou destaque – e faz emergir mais uma discussão sobre as buscas de soluções milagrosas para a perda de peso

Quebrar crenças e esclarecer mecanismos de estratégias arriscadas para diminuir alguns poucos números na balança também compõem o pool de responsabilidade social dos nutricionistas. Reduzir o percentual de gordura corporal e, de fato, emagrecer só é possível por meio da mudança de comportamentos (não só relacionados a alimentação) e o nutricionista que souber trabalhar com estes aspectos sempre estará à frente na promoção da saúde de seus pacientes. 

Referências bibliográficas

Alvarenga, M et al. (Org.). Nutrição comportamental. 2. ed. Barueri: Manole, 2019. 

Alvarenga, M (Org.). Nutrição comportamental: Ciência, Prática Clínica e Comunicação. 1. ed. Barueri: Manole, 2022. 

Douglas R, editor. Fisiologia Aplicada à Nutrição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006. 

Figueiredo P; Vieira BM. Mulher que tomou chá emagrecedor morre após rejeição de fígado transplantado [Internet]. São Paulo: G1; 2022 Fev . Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2022/02/04/morre-mulher-que-tomou-cha-emagrecedor-apos-rejeicao-no-transplante-de-figado 

Gavrić A, Ribnikar M, Šmid L, Luzar B, Štabuc B. Fat burner-induced acute liver injury: Case series of four patients. Nutrition. 2018 Mar;47:110-114. doi: 10.1016/j.nut.2017.10.002. Epub 2017 Nov 6. PMID: 29310849. 

Gualano B. Palestra “Ciência vs Modernidade” [vídeo na Internet]. YouTube. 2023 Mar; [acessado em 14 de dezembro de 2023]. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=-8tEGNrffV8 

Jeukendrup AE, Randell R. Fat burners: nutrition supplements that increase fat metabolism. Obes Rev. 2011 Oct;12(10):841-51. doi: 10.1111/j.1467-789X.2011.00908.x. PMID: 21951331. 

Fonte imagens: Canva


Uma resposta para “Festa do chá: afinal, algum deles ajuda a emagrecer?”

  1. Patrícia Carvalho

    Excelente!

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