Alimentação sustentável: Qual é o papel do nutricionista? 

Nos últimos anos, a preocupação com o impacto ambiental de nossas escolhas alimentares tem ganhado cada vez mais destaque. O […]


Nos últimos anos, a preocupação com o impacto ambiental de nossas escolhas alimentares tem ganhado cada vez mais destaque. O conceito de alimentação sustentável vai além do que simplesmente escolher determinados alimentos em detrimento de outros; mas envolve a consideração sobre a origem dos produtos, os métodos de produção e o impacto dessas escolhas sobre o meio ambiente e a sociedade.

Diante dessa realidade, surge um questionamento: qual o papel do nutricionista nesse cenário? Será que devemos focar apenas em demandas individuais ou precisamos olhar para os rumos da sociedade como um todo? 

O que é sustentabilidade?  

Sustentabilidade, de forma ampla, refere-se à capacidade de atender às necessidades do presente sem comprometer as gerações futuras. Isso implica um equilíbrio entre o uso dos recursos naturais e a preservação dos mesmos para que possam continuar disponíveis ao longo do tempo.

No contexto da alimentação, a sustentabilidade envolve assegurar que a produção e o consumo de alimentos não causem danos irreparáveis ao meio ambiente, além de garantir que esses processos sejam socialmente justos e economicamente viáveis. 

Alimentação sustentável: como as escolhas nutricionais impactam o planeta

A alimentação sustentável é uma prática que se apoia em quatro pilares interconectados: o ambiental, o social, o econômico e o de saúde.

Para compreendê-la melhor, é importante entender como cada um desses pilares contribui para a formação desse conceito: 

  • Ambiental: Uma alimentação sustentável respeita os limites dos recursos naturais. Isso inclui a redução do desperdício de alimentos, a escolha de produtos que demandam menos para sua produção, e a preferência por alimentos que resultem em menores emissões de poluentes. 
  • Social: A equidade social também é fundamental. Isso envolve garantir que todos tenham acesso a alimentos de qualidade e que as condições de trabalho nas cadeias de produção sejam justas e dignas. 
  • Econômico: Para ser sustentável, a alimentação deve ser economicamente viável, tanto para produtores quanto para consumidores. Isso significa promover práticas agrícolas que possam ser mantidas no longo prazo sem dependência excessiva de insumos que tragam um impacto ambiental ou esgotamento de recursos. 
  • Saúde: Uma alimentação sustentável é, acima de tudo, saudável. Isso envolve a promoção de práticas que atendam às necessidades nutricionais da população, ao mesmo tempo em que reduzem o consumo de produtos ultraprocessados (em âmbito populacional) e incentivam o consumo de alimentos frescos, locais e sazonais. 

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O ato de comer está diretamente conectado à preservação dos recursos naturais. A escolha de alimentos que respeitam o meio ambiente, como orgânicos ou produzidos por métodos de agricultura regenerativa, pode ter um impacto positivo na saúde do planeta.

Práticas alimentares que minimizam o desperdício, como o consumo consciente e a valorização de produtos de baixo impacto ambiental, ajudam a conservar os recursos naturais. Conectar práticas alimentares com a preservação de recursos é, portanto, uma medida que beneficia não só o ambiente, mas também a sociedade e as futuras gerações.

No entanto, é essencial considerar a equidade social nesse processo. Não é realista propor uma alimentação sustentável que seja inacessível a grande parte da população, seja pelo preço elevado ou pela indisponibilidade de alimentos. 

Disparidade no acesso aos alimentos

Outro ponto importante é a desigualdade de acesso a alimentos diversos. Em muitas regiões do mundo, a desnutrição e a obesidade coexistem, criando um paradoxo no sistema alimentar global. Assim, as ações para enfrentar esses desafios precisam ser abrangentes e incluir a promoção de uma alimentação mais justa e acessível para todos. 

Nutricionistas e a Sustentabilidade: um papel fundamental para o futuro da alimentação

E agora entra a pergunta inicial: o nutricionista tem ou não algo a ver com a sustentabilidade? A resposta é sim, mas com nuances. Esse papel varia conforme a área de atuação do profissional. 

Os nutricionistas que lidam diretamente com o público desempenham um papel importante na promoção de escolhas alimentares mais conscientes. Embora a sustentabilidade não precise ser o foco principal do atendimento, ela deve ser considerada dentro do contexto de orientação nutricional.

Um exemplo disso é o mapeamento do ambiente alimentar em que o paciente está inserido, que pode revelar desafios e oportunidades para escolhas mais sustentáveis. Além disso, a simples orientação sobre a leitura de rótulos e a escolha de alimentos locais e frescos pode ter um impacto positivo, incentivando práticas que ajudem a reduzir a pegada ambiental.

Pequenos ajustes nas recomendações diárias, como incentivar o consumo de produtos sazonais, podem ser uma maneira eficiente de integrar a sustentabilidade no atendimento sem sobrecarregar o paciente com informações complexas. 

Sustentabilidade: contribuições dos nutricionistas de acordo com suas especialidades

Para os nutricionistas que atuam em serviços de alimentação, o foco na sustentabilidade se reflete nas decisões relacionadas à compra de alimentos. Esses profissionais têm a possibilidade de garantir que a matéria-prima utilizada seja de origem sustentável, quando for possível ponderar sobre a escolha de fornecedores.

Além disso, dar preferência a produtos locais e que sigam normas de sustentabilidade é uma maneira de promover mudanças significativas no fornecimento de alimentos, influenciando não só a qualidade das refeições, mas também o impacto ambiental da instituição. 

No setor público, embora poucos nutricionistas consigam seguir neste caminho, as possibilidades de atuação são amplas e de grande relevância. Nutricionistas que trabalham na administração pública podem se envolver em projetos que impactam diretamente a sustentabilidade alimentar, como a criação de hortas comunitárias ou o desenvolvimento de programas de alimentação escolar sustentáveis. Além disso, parcerias com setores da agricultura familiar podem ser estabelecidas, promovendo uma cadeia produtiva mais justa e sustentável.

No entanto, o sucesso dessas iniciativas depende de políticas públicas consistentes e de longo prazo, que garantam o suporte necessário para que essas ações possam prosperar e gerar resultados concretos na melhoria da alimentação da população. 

Por fim, no ambiente acadêmico, os nutricionistas têm a missão fundamental de comunicar adequadamente os resultados das pesquisas relacionadas à sustentabilidade. A produção de estudos relevantes é essencial para o avanço da área, mas saber transmitir essas informações de maneira clara e acessível é igualmente importante.

Como o nutricionista pode fazer a diferença na sustentabilidade

Evitar a disseminação de desinformação, que ocorre com frequência no debate sobre alimentação sustentável, é um dos maiores desafios enfrentados por esses profissionais. Além disso, a atuação acadêmica vai além da pesquisa, desempenhando um papel crucial na formação de uma consciência crítica tanto entre os estudantes quanto no público em geral, ajudando a moldar uma visão mais ampla e consciente sobre o impacto das escolhas alimentares. 

O nutricionista tem a responsabilidade ética de integrar a sustentabilidade em suas práticas, mas isso precisa ser feito de maneira realista e acessível. Confrontar indiscriminadamente a indústria e o setor agropecuário não é uma abordagem produtiva, pois dependemos desses setores para nos alimentar.

Em vez de radicalismos, o caminho mais eficaz está no diálogo e na cooperação, buscando soluções que construam um sistema alimentar mais sustentável. O papel do nutricionista, portanto, é multifacetado e desafiador, mas crucial para promover escolhas alimentares que beneficiem tanto a saúde individual quanto o meio ambiente e as futuras gerações. 

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Texto por Felipe Daun: nutricionista, mestre e doutor pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Aprimorando em Transtornos Alimentares pelo AMBULIM IPq-FMUSP. Professor do Instituto Nutrição Comportamental e colaborador da Academia da Nutrição. 

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