Sarcopenia: O papel das proteínas no envelhecimento 

A sarcopenia é uma condição caracterizada pela perda progressiva de massa e força muscular, muito comum em idosos. Embora a […]


A sarcopenia é uma condição caracterizada pela perda progressiva de massa e força muscular, muito comum em idosos. Embora a redução da massa muscular tenha sido o principal foco por muito tempo, as definições mais recentes enfatizam a força muscular como critério primário para o diagnóstico. 

 Isto acontece, pois, a diminuição dessa força é um dos fatores que mais impactam negativamente a qualidade de vida, aumentando o risco de quedas, fraturas, dependência funcional e outras condições adversas. Qual o possível papel do nutricionista na prevenção desta condição? E qual o conhecimento necessário sobre saúde muscular para embasar intervenções? 

O Papel da Proteína na Manutenção da Saúde Muscular 

O desenvolvimento do músculo ao longo da vida é um processo dinâmico, regulado por um equilíbrio entre a síntese e a degradação de proteínas musculares. Durante a infância e adolescência, o crescimento muscular é acentuado, impulsionado pelo aumento dos hormônios de crescimento, pela alimentação e pela atividade física.  

Na idade adulta, embora o crescimento muscular se estabilize, ele ainda pode ser aprimorado por meio de atividades físicas, especialmente o treinamento de resistência, e pela ingestão adequada de proteínas. No entanto, à medida que o envelhecimento avança, ocorre uma mudança significativa nesse equilíbrio, com a síntese proteica diminuindo, enquanto a degradação se mantém ou até aumenta.  

Esse processo é acelerado pela redução dos níveis hormonais, como testosterona e hormônio de crescimento, e também pela diminuição na resposta anabólica aos nutrientes, principalmente às proteínas. 

Nesse contexto, a ingestão de proteínas torna-se ainda mais relevante com o envelhecimento, já que seu papel na manutenção das funções musculares é crítico. Todavia, nem todas as fontes de proteínas são iguais no que diz respeito à sua capacidade de promover a saúde muscular. 

Proteínas de origem animal são consideradas de alta qualidade porque possuem uma alta digestibilidade, o que significa que são facilmente absorvidas e utilizadas pelo organismo.  

Em particular, a carne é uma fonte excelente de leucina, um aminoácido chave que desempenha um papel crucial na ativação da síntese proteica muscular. Isso faz com que a proteína animal seja particularmente eficaz na promoção da manutenção e recuperação muscular, especialmente em populações vulneráveis como os idosos. 

A tradicional combinação de arroz e feijão é conhecida por fornecer todos os aminoácidos essenciais, mas estudos com animais mostram que a matriz alimentar é relevante e que a capacidade de síntese proteica do organismo é inferior quando baseada exclusivamente em fontes vegetais. 

A Distinção Entre Carne in Natura e Produtos Ultraprocessados 

É importante observar que a carne, de modo geral, é frequentemente criticada por suas associações com problemas como doenças cardiovasculares, câncer e obesidade. Essas críticas, no entanto, muitas vezes não fazem uma distinção clara entre o consumo de carne in natura e o consumo de produtos ultraprocessados à base de carne. Todos os cortes de carnes oferecem nutrientes essenciais para a saúde muscular e metabólica, como ferro, zinco, vitaminas do complexo B, além de proteínas de alta qualidade. 

Os produtos ultraprocessados, por outro lado, são frequentemente desbalanceados e ricos em gorduras saturadas e sódio, sendo este consumo habitual associado a desfechos negativos à saúde. Essa distinção entre carne e produtos cárneos é crucial para uma compreensão mais precisa sobre os efeitos da carne na saúde. Infelizmente, muitas vezes o debate se perde em generalizações, levando às ideias equivocadas sobre o consumo de carne. 

Nesse sentido, o incentivo ao consumo adequado de carne deve ser visto como parte de uma estratégia integral para a promoção da saúde muscular – em todas as fases da vida. Esse incentivo, no entanto, precisa ser feito com bom senso e respeito às escolhas individuais e culturais. A recomendação de incluir carne na alimentação não deve ser interpretada como um chamado para que se consuma churrasco diariamente ou para que se substituam refeições caseiras por lanches de redes de fast food. Ao contrário, o consumo de carne deve estar integrado a uma alimentação variada e caseira, que valorize a cultura alimentar de cada indivíduo e respeite suas preferências e crenças. 

Em casos onde o consumo de carne não é possível, seja por questões éticas, religiosas, culturais ou por condições de saúde específicas, é fundamental garantir que as outras fontes de proteínas sejam cuidadosamente planejadas. A combinação de diferentes alimentos vegetais para garantir um perfil completo de aminoácidos, o uso de leguminosas, grãos, nozes e sementes, e, em alguns casos, o uso de suplementos proteicos adequados, pode ser importante para a prevenção de condições relacionadas à perda muscular. 

 A atenção redobrada à ingestão proteica nesses casos é essencial, já que a menor biodisponibilidade e qualidade das proteínas vegetais podem exigir um consumo mais elevado para atingir os mesmos benefícios que as proteínas animais proporcionam. 

O papel dos nutricionistas é guiar as escolhas alimentares de forma individualizada, respeitando as crenças e preferências dos pacientes, ao mesmo tempo em que asseguram que as necessidades nutricionais sejam supridas adequadamente. Soma-se ainda a necessidade de desmistificar equívocos de interpretação que são muito comuns nesta área e, inevitavelmente, afetam as crenças dos pacientes. Arroz e feijão é fundamental, mas a carne também é. 

Texto por Felipe Daun: nutricionista, mestre e doutor pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Aprimorando em Transtornos Alimentares pelo AMBULIM IPq-FMUSP. Professor do Instituto Nutrição Comportamental e colaborador da Academia da Nutrição. 

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