As reações alérgicas aos alimentos acontecem quando o sistema imunológico do corpo reage exageradamente à ingestão de certas substâncias. De forma geral, os estudos atestam um crescente de casos nas últimas décadas, seja por mais diagnósticos, como por maior variedade de exposição aos alimentos.
Estimar a prevalência em nível populacional, entretanto, têm se mostrado um desafio, por divergências de classificação e limitações dos métodos. Muitos dos dados para esta estimativa se referem à alergia autodeclarada, ou seja, sem constatação laboratorial, e trazem uma variação entre 9% e 35% de prevalência na população adulta – estudos mais fechados, por outro lado, estimaram a prevalência de alergias em 3,5% dos adultos e 6% das crianças (Nwaru et al., 2024; Lyons et al., 2019; Labrosse et al., 2020).
Este cenário vasto abre grandes janelas de oportunidades para os nutricionistas, pois além de poderem se deparar com indivíduos que possuam alergia, de fato, também podem precisar esclarecer a situação e acalmar os ânimos daqueles que não têm.
O que são as alergias alimentares? Quais os tipos?
As alergias alimentares são classificadas de acordo com o tipo de resposta imune aos antígenos ingeridos: mediadas por imunoglobulina E (IgE); não mediadas por IgE; e mistas (Solé et al., 2018).
IgE |
Não-IgE |
Mistas |
Ocorrem logo após a ingestão do alimento e podem causar sintomas que afetem a pele (ex: urticária, angioedema), o trato respiratório (ex: tosse, congestão nasal) e até mesmo o sistema cardiovascular (ex: hipotensão). Em casos mais graves, pode ocorrer anafilaxia, uma reação alérgica potencialmente fatal. | São causadas por uma resposta de hipersensibilidade tardia, envolvendo linfócitos T, e não pela IgE específica. Essas reações podem afetar diferentes porções do trato gastrointestinal (ex: Síndrome da enterocolite induzida por proteína alimentar, Síndrome da proctocolite alérgica induzida por proteína alimentar, Síndrome da enteropatia induzida por proteína alimentar e doença celíaca), a pele (ex: dermatite de contato a alimentos e dermatite herpetiforme) e os pulmões (ex: Síndrome de Heiner ou hemossiderose pulmonar). A gravidade dos sintomas é individual e depende do órgão afetado. | Envolvem a ação de diferentes componentes do sistema imunológico, incluindo o anticorpo IgE, linfócitos T e citocinas e podem se manifestar como gastropatias eosinofílicas (ex: esofagite eosinofílica, gastrite eosinofílica e gastroenterite eosinofílica), dermatite atópica e asma. Esses sintomas variados estão relacionados à interação complexa entre os diferentes componentes imunológicos envolvidos neste tipo de resposta. |
Quais os principais alimentos que podem causar alergia?
Vários alimentos são conhecidos por desencadear reações alérgicas em algumas pessoas. Os principais são:
- Leite: A alergia ao leite de vaca é comum em crianças, mas pode afetar adultos também. Tais casos podem se manifestar em respostas imunes mediadas por IgE (com respostas mais imediatas que afetam a pele e o trato respiratório) ou não mediadas por IgE (respostas mais lentas afetando o trato gastrointestinal).
- Ovos: A alergia a ovos é outra alergia alimentar comum, especialmente em crianças. Nos casos não mediados por IgE, a principal resposta é a diarreia crônica e espera-se uma resolução até os 3 anos de idade.
- Amendoim: O amendoim é uma das principais causas de alergia alimentar grave, sendo um tipo de alergia exclusivamente mediado por IgE (ou seja, se o paciente comeu muito amendoim e teve diarreia, provavelmente não se trata de alergia). Alguns casos podem desencadear reações alérgicas potencialmente fatais, como anafilaxia.
- Peixes e frutos do mar: Certos peixes, como salmão, atum e bacalhau e alguns frutos do mar, como camarão, lagosta, caranguejo e moluscos, podem causar alergias graves em certas pessoas, mediadas por IgE. A exposição inicial que causa a alergia não necessariamente é pela ingestão, mas pode ser pelo contato com a pele ou até mesmo a inspiração dos vapores de cozimento destes alimentos.
- Trigo: A alergia ao trigo pode se manifestar de diferentes formas, quando mediada por IgE é conhecida como “alergia a proteína do trigo”, já quando não mediada por IgE pode ser uma manifestação da doença celíaca.
No caso de algumas proteínas que causam reações adversas mediadas por IgE, pode ser indicado uma imunoterapia que envolva a exposição do indivíduo a preparações com estas proteínas cozidas – uma vez que o tratamento térmico altera a conformação das proteínas e pode ajudar no processo de tolerância.
Casos assim devem ter indicação médica e o nutricionista será fundamental no desenvolvimento do plano alimentar junto com o paciente.
É fundamental ressaltar a importância do diagnóstico médico adequado na avaliação das alergias alimentares. Apenas um médico especializado pode realizar os exames e testes necessários para confirmar e diferenciar as condições alérgicas, garantindo um tratamento adequado e seguro.
As discrepâncias entre as alergias autorrelatadas pelos pacientes e as alergias diagnosticadas, encontradas nos estudos, realçam a importância dos nutricionistas não confiarem exclusivamente nas informações fornecidas pelos pacientes, devendo investigar mais a fundo e encaminhá-los para o médico quando necessário.
Mesmo nos casos de alergias não mediadas por IgE, é crucial realizar uma investigação detalhada das respostas no trato gastrointestinal. Por vezes, os sintomas podem ser erroneamente atribuídos a uma alergia, quando na verdade são resultado do excesso de consumo de determinado alimento, como o consumo excessivo de gordura do amendoim.
Portanto, para uma avaliação precisa das alergias alimentares, o envolvimento de profissionais de saúde especializados, médicos e nutricionistas, é essencial.
A colaboração entre esses profissionais e uma investigação minuciosa dos sintomas são fundamentais para garantir o diagnóstico correto, a compreensão das necessidades individuais e a adoção de medidas apropriadas para prevenir reações adversas e promover uma alimentação segura e saudável.
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Referências
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