A Síndrome do Ovário Policístico (SOP) é uma das endocrinopatias mais prevalentes em mulheres, com uma incidência entre 6 a 16% da população em idade reprodutiva.
É importante ressaltar que esta síndrome possui um perfil bastante heterogêneo, com diferentes graus de sintomatologia e acometimento e que, embora multifatorial, sua etiologia ainda é em parte desconhecida.
A Fisiopatologia da SOP
O diagnóstico da SOP é realizado na presença de ao menos 2 dos 3 critérios de Rotterdam: oligo ou anovulação, hiperandrogenismo e ovário policístico.
Tendo como uma das causas genéticas, foram observadas em pacientes com SOP alterações em genes associados à resistência insulínica, acúmulo de gordura, hiperandrogenismo e irregularidade menstrual, além de maiores chances de desenvolvimento em filhas de pais com hipertensão arterial e acidente vascular cerebral.
A nível hipotalâmico, alterações neuronais levam a um desbalanço no hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH), que libera uma quantidade de hormônio luteinizante (LH) aumentada e de hormônio folículo estimulante (FSH) reduzida, levando, por sua vez, a uma produção aumentada de hormônios androgênicos pelas células TECA, predominando a testosterona.
Esses elevados níveis de andrógenos ajudam a manter elevada a relação LH/FSH, além de aumentarem a resistência à insulina.
Em adição, a insulina também atua nas células da TECA estimulando a produção dos hormônios androgênicos, que estimulam a produção e o aumento de adipócitos.
Causas ambientais e comportamentais também facilitam o aumento e a manutenção do tecido adiposo, aumentando a inflamação sistêmica pela secreção de adipocinas e citocinas.
Ocorre também secreção de enzimas pelos adipócitos envolvidas em uma maior produção de hormônios esteroides.
O acúmulo de gordura também promove maior secreção de grelina e leptina que, associadas a uma resistência à ação da leptina, geram aumento de apetite e predileção por alimentos mais palatáveis (por exemplo, aqueles com excesso de açúcares e gorduras).
Enfim, a fisiopatologia da SOP é considerada um ciclo, no qual as alterações metabólicas que ocorrem fazem manutenção de si próprias, dificultando a busca por uma causa que inicie a síndrome.
A SOP e suas manifestações clínicas e bioquímicas
Em definição, síndromes são patologias caracterizadas por um conjunto de sinais e sintomas.
Na SOP, os principais são hirsutismo, infertilidade, alopecia, acne, disfunção menstrual, complicações e perda de gravidez, acantose nigricante, alterações na microbiota intestinal.
Por conta da sua fisiopatologia, pacientes com SOP possuem risco aumentado de desenvolver doenças cardiovasculares, dislipidemias, hipertensão arterial, diabetes, obesidade, síndrome metabólica, disfunções endócrinas, distúrbios emocionais e câncer de endométrio, e por conta disso um acompanhamento multiprofissional se faz indispensável para controle da sintomatologia e prevenção de agravos.
Enquanto nutricionista, é possível solicitar exames bioquímicos para pacientes que já possuem diagnóstico ou para aquelas que possuem manifestações clínicas.
Os principais marcadores para avaliar são testosterona total e livre, globulina ligadora de hormônios sexuais (SHBG), hormônio antimülleriano (AMH), hemoglobina glicada, glicemia, insulina e hemoglobina em jejum, colesterol total e frações, triglicérides e 17α-hidroxiprogesterona.
Embora nutricionistas não possam realizar diagnóstico, é permitido fazer triagem e encaminhamento a um endocrinologista ou ginecologista quando necessário.
Tratamento nutricional da SOP
Além de estimular uma prática de atividade física regular e um sono adequado, é importante que ocorra um ajuste quantitativo e qualitativo dos alimentos ingeridos.
Para mulheres com excesso de peso, uma redução de 5 a 10% do peso corporal já promove melhorias nas alterações metabólicas.
Szczuko et al. (2021) recomenda uma restrição calórica de 500 a 1000 kcal/dia, porém é possível iniciar com quantidades menores visando maior aderência e, se for necessário, progredir ao longo do acompanhamento.
Pensando na tendência aumentada de resistência insulínica, Kazemi et al. (2021) avaliou trabalhos com dietas reduzidas em índice e carga glicêmica, e pode observar que elas promoveram redução de biomarcadores como índice HOMA-IR, insulina de jejum, colesterol total e frações, triglicerídios, circunferência de cintura e testosterona total.
Em uma revisão sistemática, Che et al. (2021) avaliou o efeito das dietas mediterrânea, cetogênica, DASH, de baixo índice glicêmico e a base de proteínas vegetais, e todas elas são capazes de promover melhoras dos parâmetros bioquímicos da SOP.
A escolha por uma ou outra deverá ocorrer em conjunto com a paciente, avaliando qual possui a melhor adesão pela mesma.
Além dos macronutrientes, faz-se fundamental um controle que promova ingestão adequada de micronutrientes e compostos bioativos.
Em relação à suplementação, é necessário realizar uma avaliação nutricional completa visando uma prescrição assertiva e adequada para cada caso.
Entretanto, alguns estudos indicam benefícios com a suplementação de determinados ativos, por exemplo:
- Vitamina D: uma dose de manutenção de 4.000 UI/dia pode melhorar quadros de resistência insulínica, dislipidemia, transtornos mentais e capacidade reprodutiva;
- Vitamina B12: o uso de metformina, fármaco que melhora o quadro de resistência à insulina, aumenta a depleção de vitamina B12, e por isso é possível utilizar uma dose de manutenção de 2,4 mcg/dia. Se já existe histórico de deficiência, avalie suplementar valores maiores;
- Coenzima Q10 e Vitamina E: a combinação destes suplementos é capaz de melhorar quadros de dislipidemias, adiposidade visceral e distúrbios cardiovasculares;
- Inositol: a depender do quadro, pode ter os mesmos efeitos de controle do metabolismo glicídico que a metformina possui, porém com menos efeitos colaterais, e por isso vale avaliar junto do médico o custo-benefício desta prescrição;
- Canela e Curcumina: suplementação diária destes ingredientes é capaz de melhorar a resistência insulínica e o metabolismo de lipídios.
A Síndrome do Ovário Policístico é heterogênea, com quadros que podem variar bastante para cada indivíduo, e por isso que uma avaliação individualizada e multidisciplinar é tão importante, seja no controle metabólico, alívio dos sintomas, prevenção do desenvolvimento de comorbidades e até na prevenção da síndrome em si.
E você, nutri? Como tem sido seus atendimentos às pacientes com SOP?
Conte para a gente aqui nos comentários, e não esqueça de compartilhar esse artigo com aquela colega nutri que atende no nicho de saúde da mulher!
Referências Bibliográficas
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