Hoje vamos falar sobre a restrição do sono e se há correlação com a pressão arterial. Para embasar essa conversa, trouxemos uma tese realizada na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
A pesquisa começa caracterizando o ciclo sono-vigília como o ciclo de 24 horas que vivemos, e que em parte estamos dormindo e na outra parte estamos acordados, em vigília.
Esse ciclo não apresenta somente os fenômenos externos de dormir e acordar, e sim, modificações internas: como mudanças na temperatura corporal, na frequência cardíaca, na liberação de hormônios, neurotransmissores entre outros.
A organização desse ciclo (24h) sono-vigília é estruturada pelo relógio biológico, representado por fatores endógenos, e pelos sincronizadores, que são os fatores externos: como jornada de trabalho, luz e som ambiente.
Quando esses fatores não estão ajustados, surgem os distúrbios do sono. Um período considerado normal corresponde entre 6 a 8 horas de sono.
Privações de sono podem ser classificadas como: parcial, na qual há uma diminuição das horas de sono seletiva em que uma fase do sono é perdida (eles ainda citam que a perda da fase REM do sono pode ser mais prejudicial do que a privação parcial de sono) e total, nos casos de insônia.
Dos efeitos mais leves ao mais pesado, temos sonolência durante o dia, mudanças de humor, estresse, cansaço, pouca concentração, comprometimento do sistema imunológico e em casos mais sérios pode-se chegar até a óbito.
A privação do sono tem sido associada ao maior risco de doenças cardiovasculares, diabetes mellitus, acidente vascular cerebral, a maiores níveis de proteína C reativa, citocinas inflamatórias e a menores níveis de sensibilidade a insulina.
Aprofundando um pouco mais: O autor fala sobre o endotélio vascular, que é uma camada celular que reveste internamente os nossos vasos sanguíneos.
Essa camada apresenta multifunções na fisiologia vascular, pois responde a hormônios, neurônios e ações mecânicas, liberando substâncias que vão agir de forma autócrina, parácrina e end��crina em como o vaso sanguíneo se comportará. Seja com mais tônus, menor calibre, maior dilatação, ação antitrombogênica e ação coagulante.
Seja aumentando ou diminuindo a sua permeabilidade, influenciando em situações como a migração de células do músculo liso, na diapedese de células imunes, ou até na maior passagem de lipoproteínas aumentando então as lesões ateroscleróticas.
A substância mais conhecida secretada pelo endotélio é o Óxido Nítrico (NO), que utiliza a L-arginina como substrato. Após ser sintetizada e liberada, permeia o endotélio e vai em direção as células musculares lisas, onde estimulam a citosólica guanilato ciclase solúvel.
Esta substância gera o aumento de GMP cíclico, que por sua vez ativa a poroteína quinase G, que provoca a diminuição da entrada de Ca2+ no citoplasma da célula e o aumento do armazenamento de Ca2+ no retículo sarcoplasmático.
Como Ca, é uma molécula sinalizadora e que atua em processos de contração, nessa situação então, teremos o relaxamento do músculo.
E ainda há outros caminhos em que o NO age na vasoconstrição ou vasodilatação. Dessa forma chegamos à Disfunção Endotelial, que basicamente é o seu funcionamento inadequado, geralmente aliada como a menor produção de NO ou a sua maior degradação.
O estudo em si foi realizado com seres humanos. O protocolo realizado consistiu em dois períodos de 5 noites, nos quais em um ocorria a privação de sono (dormir mais de 3,5 horas e menos de 5 horas) e no outro ocorria um sono controlado (dormir mais de 7 horas e menos de 9,5 horas).
Sendo que entre esses dois períodos haviam 2 noites (dormir pelo menos 7 horas).As coletas sanguíneas, análise da reatividade vascular e avaliação autonômica ocorreram em dois momentos, logo após os dois períodos.
Dessa forma, os resultados foram que a redução de sono, aparentemente inofensiva por ser tão comum nos dias atuais, durante 5 noites, apresentou efeitos no endotélio gerando a sua disfunção, diminuindo a venodilatação (aumentando então a venoconstrição) e alterando a atividade simpática, com o aumento dos níveis séricos de norepinefrina.
Assim como dificuldades no controle de variação comuns da pressão arterial. Você lembra que já fizemos aqui um artigo sobre a Medicina do Estilo de Vida e um dos seus pilares é o sono?
Para tratarmos um paciente, ele tem que ser visto como um todo. Se ele não está dormindo bem ou não está dormindo o suficiente, é necessário um olhar para auxiliá-lo primeiro a compreender o quanto dormir é necessário para a sua saúde.
E em segundo lugar auxiliar na organização do seu dia e de suas tarefas, para que um sono restaurador seja incluído no mesmo nível de importância que uma boa alimentação.
Se o seu paciente não dorme bem, será que vai adiantar você mexer somente na dieta, na distribuição de macronutrientes, na troca da gordura saturada por mono e polinsaturada? Sim, todas essas ações podem e vão trazer benefícios, mas você precisará ajudar a ajustar o sono para que os objetivos de uma saúde global sejam alcançados.
Em conclusão, destacamos nesse artigo sobre a privação de sono com alterações da pressão arterial, mas vale refletirmos ainda sobre como os efeitos comportamentais gerados, como as alterações de humor, estresse e sonolência interfeririam no consumo alimentar.
Referências bibliográficas
- DETTONI, Josilene Lopes. Efeitos da privação parcial do sono no endotélio venoso e no controle autonômico em voluntários saudáveis. 2008. 128 f. Tese (Doutorado) – Curso de Pneumologia, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/5/5150/tde-13012009-103641/publico/Josileneldettoni.pdf.
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