A Síndrome do Intestino Irritável (SII) é uma condição gastrointestinal crônica mais comum e que atinge aproximadamente 11% da população global. Caracterizada por sintomas como dor abdominal recorrente, distensão abdominal, diarreia ou constipação, ou uma combinação desses sintomas, a SII pode ter um impacto significativo na qualidade de vida dos pacientes.
Diante disso, um dos protocolos mais eficazes no manejo desses sintomas é a dieta FODMAP, que tem ganhado atenção significativa nos últimos anos.
Este guia foi elaborado para nutricionistas que desejam compreender e aplicar o Protocolo FODMAP de maneira eficaz e baseada em evidências. Além disso, trouxemos um estudo de caso clínico exclusivo com a nutricionista Dra. Ana Carolina Franco de Moraes, especialista no manejo da microbiota intestinal e dieta Low FODMAP.
O que é o Protocolo Fodmap?
Fodmap é um acrônimo para Fermentable Oligosaccharides, Disaccharides, Monosaccharides and Polyols, na qual a letra F representa os alimentos fermentáveis, a letra O representa os oligossacarídeos, D são os dissacarídeos, M são os monossacarídeos e P de polióis, que são álcoois de açúcar.
A dieta com baixa ingestão de FODMAPs tem sido a principal conduta estudada e recomendada para o tratamento da SII. O protocolo baixo em FODMAPs consiste na diminuição do consumo ou retirada total de alimentos por um tempo determinado para obter melhora de sinais e sintomas relacionados a SII.
Alimentos com alto teor de FODMAPs são pouco absorvidos pelo intestino delgado e servem de alimento para bactérias do cólon, o que leva a uma produção excessiva de gases e, muitas vezes, causa dor e inchaço abdominal e diarreia
Etapas do Protocolo FODMAP
O Protocolo FODMAP é dividido em três fases principais: eliminação, reintrodução e adaptação.
- Fase de Eliminação:
Na primeira fase, há uma redução inicial de todos os alimentos ricos em FODMAPs, porém, nenhum grupo alimentar deve ser excluído por completo, sendo necessário trocar os alimentos com alto teor de FODMAPs por alimentos com baixo teor.
Esta fase deve durar entre 2 e 6 semanas, devendo evitar-se períodos prolongados sob esta restrição, uma vez que poderá gerar carências nutricionais.
Caso ocorra alívio dos sintomas deverá passar-se à fase seguinte, caso contrário deverá prolongar-se até às 6 semanas e no caso de os sintomas não melhorarem, deverá procurar-se uma abordagem diferente.
- Fase de Reintrodução:
A segunda fase consiste na reintrodução controlada dos alimentos ricos em FODMAPs para identificar níveis de tolerância para cada alimento e subgrupo de FODMAPs.
Inicialmente, as quantidades a testar devem ser pequenas, mas se o paciente se sentir bem, poderá aumentá-las até uma dose normal de consumo desse alimento.
O paciente deve primeiramente testar um alimento inserido num dos subgrupos individuais dos FODMAPs, podendo ser realizado o teste com o mesmo alimento durante três dias seguidos, aumentando a dose em 50% por dia. Posteriormente, deve testar os restantes subgrupos.
Entre cada nova introdução de alimentos pode ser dado um intervalo de um a três dias, porém os sintomas devem ser monitorados todos os dias e não apenas nos dias de reintrodução.
Devem, igualmente, excluir-se os alimentos do grupo anteriormente testado, a menos que haja uma total ausência de sintomas com esses mesmos alimentos, situação em que os pacientes podem optar por passar diretamente para a reintrodução seguinte. Depois deve testar a combinação entre os vários subgrupos dos FODMAPs.
- Fase de Adaptação:
A terceira fase consiste na manutenção da dieta adaptada. O objetivo desta fase é reintroduzir o máximo de alimentos ricos em FODMAPs na dieta conforme tolerado na fase anterior, mantendo um bom controle dos sintomas e evitando restrições desnecessárias.
Assim, após identificados os alimentos que desencadeiam os sintomas, estabelece-se um plano alimentar individual, onde se excluem esses mesmos alimentos, garantindo uma alimentação balanceada e personalizada a longo prazo.
Exemplos de Alimentos Ricos e Pobres em FODMAPs
- Ricos em FODMAPs:
Oligossacáridos: Alcachofras, espargos, beterrabas, couve-de-bruxelas, brócolos, couve, erva-doce, alho, alho francês, quiabo, cebola, ervilha, cebolinha, trigo, centeio, cevada, leguminosas, lentilhas, grão-de-bico, maçã, pêssego, dióspiro, melancia e pistácio, e produtos processados
Dissacáridos: Leite, iogurte, gelado, creme inglês e queijos de pasta mole
Monossacáridos: Maçãs, cerejas, mangas, peras, melancia, espargos, alcachofras, ervilhas, mel e xarope de milho com alto teor de frutose
Polióis: Maçãs, damascos, cerejas, peras, nectarinas, pêssegos, ameixas, ameixas secas, melancia, abacate, couve-flor, cogumelos, ervilhas-tortas e os adoçantes artificiais sorbitol, manitol, maltitol, xilitol e isomalte
- Pobres em FODMAPs:
Oligossacarídeos: banana, a maioria das frutas silvestres (exceto amoras), uvas, limão, lima, tangerina, laranja, kiwi, abacaxi, maracujá, ruibarbo, pimentão, acelga chinesa, feijão verde, beterraba prateada, pepino, cenoura, aipo, beringela, alface, batata, inhame, tomate, abobrinha, grãos/farinha sem trigo, pão ou produtos à base de cereais sem glúten e quinoa.
Dissacarídeos: Produtos lácteos sem lactose leite a base de amêndoas ou arroz, iogurte e sorvete, queijo duro, queijo feta e queijo cottage.
Monossacarídeos: banana, melão, kiwi, limão, lima, tangerina, laranja, maracujá, mamão, a maioria das frutas silvestres (exceto amoras e amoras silvestres), xarope de bordo e xarope de dourado.
Polióis: xarope de bordo e açúcar (sacarose), banana, uva, melão, melão, kiwi, limão, tangerina, laranja, maracujá e mamão.
Entrevista Exclusiva: Caso Clínico de Sucesso
Para complementar este guia, trouxemos uma entrevista exclusiva com a nutricionista Dra. Ana Carolina Franco de Moraes, especialista no manejo da microbiota intestinal e dieta Low FODMAP.
Ela compartilhou um caso clínico de sucesso onde o protocolo foi aplicado, detalhando as etapas seguidas e os resultados alcançados. Confira a seguir:
Dra. Ana, pode compartilhar um caso clínico de sucesso onde o Protocolo FODMAP foi aplicado? Quais foram as principais etapas e resultados?
Minha experiência com a dieta low FODMAP é vasta e já abrange centenas de pacientes que seguiram o protocolo.
O que posso afirmar, é que apesar dos estudos científicos indicarem que por volta de 70% das pessoas com SII terão melhora dos sintomas com essa dieta, na prática, esse número chega a 90%. É importante entender que o objetivo final do protocolo é ampliar a alimentação e não restringir!
Um caso emblemático que tive, foi de uma mulher jovem de 24 anos que apresentava de 10 a 15 evacuações líquidas diárias por mais de quatro anos. Após muitos exames e médicos diferentes, foi diagnosticada com SII e retocolite ulcerativa.
Ela me procurou porque já não aguentava mais essa situação. Sugeri o protocolo low FODMAP e em apenas duas semanas de dieta, as evacuações passaram de Bristol 7 para Bristol 5 e reduziram para cerca de cinco episódios de evacuações ao dia.
Quando completamos três semanas, a melhor notícia chegou. Ela finalmente estava evacuando uma vez ao dia com consistência normal (Bristol 4).
Esse exemplo é um reflexo do que vejo diariamente no consultório. A dieta low FODMAP bem conduzida, muda para sempre a vida do nosso paciente.
Conheça Dra. Ana Carolina Franco de Moraes
Profa. Dra. Ana Carolina Franco de Moraes, Nutricionista pela Puc-Campinas com mestrado em Enfermagem pela Unicamp, doutorado em Nutrição em Saúde Pública pela USP e Pós-doutorado em Epidemiologia pela USP.
Certificada em dieta low FODMAP pela Monash University. Criadora do Curso Ciência do Intestino e do Guia Prático da Dieta Low FODMAP. Autora de diversos capítulos e artigos científicos sobre microbiota intestinal e doenças gastrointestinais.
Atuação na Prática Clínica
Para implementar o Protocolo FODMAP, o nutricionista deve adotar uma abordagem colaborativa com o paciente, educando-o sobre os alimentos permitidos e proibidos, além de fornecer receitas e opções de refeições.
Ferramentas como diários alimentares e aplicativos de acompanhamento podem ser úteis para monitorar a resposta do paciente e ajustar a dieta conforme necessário.
Em conclusão, a dieta FODMAP é uma intervenção eficaz para o manejo dos sintomas da Síndrome do Intestino Irritável, proporcionando alívio significativo para muitos pacientes.
Ao seguir um protocolo estruturado e baseado em evidências, os nutricionistas podem ajudar seus pacientes a identificarem os alimentos que desencadeiam sintomas e a criar uma dieta personalizada que melhora a qualidade de vida.
Referências Bibliográficas
- Tsui W, Santos GC dos, Almeida SG de. Manejo nutricional no tratamento da síndrome do intestino irritável (SII). Research, Society and Development [Internet]. 2023 Jun 14;12(6):e13612642135–e13612642135. Disponível em: https://rsdjournal.org/index.php/rsd/article/view/42135
- Papel do nutricionista numa dieta restrita em FODMAPs. Acta Portuguesa de Nutrição [Internet]. 2020 Dec 31;23. Disponível em: https://actaportuguesadenutricao.pt/wp-content/uploads/2021/02/10_ARTIGO-REVISAO.pdf
- Ferreira M, Das G, Bucchianico F, Garcia. A DIETA POBRE EM FODMAP EM PORTADORES DA SII [Internet]. Disponível em: https://fait.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/X27W0OxYbnJx99b_2022-9-6-20-17-36.pdf
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