Câncer de Mama: Hábitos Alimentares podem fazer a diferença?

Outubro Rosa: a nutrição é essencial na prevenção do câncer de mama. Escolhas saudáveis fazem a diferença na saúde da mulher


O câncer de mama é uma das principais causas de morte por câncer entre mulheres no mundo, o que gera grande interesse em estratégias de prevenção, incluindo a alimentação. No entanto, é crucial destacar que não existe uma dieta capaz de prevenir totalmente o câncer, inclusive o de mama.

A alimentação, embora seja um fator importante na promoção da saúde, interage com muitos outros elementos, como predisposição genética e fatores ambientais, que podem influenciar o risco de desenvolver a doença – e as pesquisas na área pretendem justamente elucidar todas essas relações, não encontrar respostas imediatistas ou soluções milagrosas.

Mesmo assim, o nutricionista tem um papel relevante ao entender essa relação, pois os pacientes frequentemente questionam sobre alimentação e prevenção do câncer. Estar informado é essencial para fornecer orientações seguras e adequadas. 

 

Câncer de Mama: Desenvolvimento e subtipos
 

O câncer de mama é caracterizado pelo crescimento anormal de células mamárias, que podem formar tumores e se espalhar para outras partes do corpo (metástase). Esse crescimento é influenciado por diversos fatores genéticos, hormonais e ambientais. Existem diferentes subtipos de câncer de mama, cada um com características biológicas distintas, o que impacta o tratamento e o prognóstico. Os principais subtipos são: 

 

Câncer de mama receptor de estrogênio positivo (ER+): As células tumorais crescem em resposta ao estrogênio. Este é o subtipo mais comum e geralmente responde bem à terapia hormonal. 

Câncer de mama receptor de progesterona positivo (PR+): Similar ao ER+, mas estimulado pela progesterona, também tratado com terapias hormonais. 

Câncer de mama HER2-positivo (HER2+): Marcado pela superexpressão da proteína HER2, é mais agressivo, mas responde bem a terapias direcionadas. 

Câncer de mama triplo-negativo (ER-, PR-, HER2-): Subtipo agressivo que não responde a terapias hormonais ou direcionadas, sendo a quimioterapia a principal opção de tratamento. 

Câncer de mama luminal A e B: Ambos expressam receptores hormonais, mas o luminal B tende a ser mais agressivo e menos responsivo à terapia hormonal. 

Câncer de mama basal-like: Agressivo e similar ao triplo-negativo, sendo caracterizado por perfis moleculares específicos. 

 

Cada subtipo de câncer de mama possui diferentes características biológicas, influenciando o tratamento e o prognóstico, mas também podem responder de forma distinta a alimentação. Os estudos que investigam a relação entre hábitos alimentares e câncer de mama mostram que o impacto dos hábitos alimentares pode variar dependendo do subtipo da doença. 

 

No caso dos subtipos receptor de estrog��nio positivo (ER+) e receptor de progesterona positivo (PR+), a ingestão elevada de gorduras saturadas tem sido associada a um pior prognóstico. A redução no consumo de gordura, especialmente as saturadas, pode ser benéfica para mulheres com esses subtipos, melhorando a sobrevida livre de recorrência.

Além disso, o consumo de frutas secas e peixe oleoso tem sido associado a uma redução no risco de câncer de mama em geral, o que pode incluir esses subtipos hormonais, conforme indicado por estudos recentes. 

 

Para o subtipo HER2-positivo (HER2+), os estudos sobre o impacto direto da alimentação ainda são limitados. Contudo, padrões alimentares ricos em frutas e vegetais, que estão associadas a um menor risco geral de câncer de mama, podem oferecer alguma proteção também para esse subtipo. Embora não haja consenso definitivo, esses alimentos são frequentemente recomendados como parte de um padrão alimentar saudável que visa a redução do risco de câncer de mama. 

 

Já o câncer de mama triplo-negativo (ER-, PR-, HER2-), sendo um dos subtipos mais agressivos, tem menos opções terapêuticas baseadas em hormônios ou terapias direcionadas. Para esse subtipo, a obesidade e uma alimentação rica em gorduras saturadas e carboidratos refinados são fatores de risco significativos. Atenção ao peso e a adoção de uma alimentação saudável podem ser estratégias importantes para melhorar o prognóstico desse grupo, ainda que os dados sobre alimentos específicos sejam menos conclusivos. 

 

Finalmente, para os subtipos luminal A e B, que possuem características hormonais similares aos subtipos ER+ e PR+, as mesmas recomendações alimentares se aplicam. A moderação no consumo de gorduras saturadas e o aumento da ingestão de frutas, vegetais e peixes oleosos, como sugerido pelos estudos, podem ser estratégias eficazes para a prevenção e o controle desses subtipos. 

 

Mas nada é tão simples! 

 

Uma revisão recente destacou a complexidade da relação entre hábitos alimentares e o risco de câncer de mama, enfatizando que muitos padrões alimentares investigados não apresentaram associação clara com a redução do risco da doença. Esse estudo utilizou uma abordagem robusta chamada randomização mendeliana (MR), que ajuda a inferir causalidade entre fatores dietéticos e o risco de câncer, eliminando muitos dos vieses presentes em estudos observacionais. 

 

A revisão analisou 10 diferentes hábitos alimentares que incluem o consumo de frutas frescas, frutas secas, vegetais cozidos, vegetais crus, peixes (não oleosos e oleosos), cereais, nozes salgadas, nozes sem sal e azeite. A grande novidade deste estudo foi a amplitude da análise: ele utilizou dados genéticos de estudos populacionais de larga escala, o que permitiu examinar a predisposição genética ao consumo desses alimentos e sua relação com o risco de câncer de mama em diversas populações. 

 

Os resultados da metanálise indicaram que, apesar de alguns alimentos, como frutas secas e peixes oleosos, estarem associados a uma redução no risco de câncer de mama, a maioria dos hábitos alimentares avaliados não demonstrou uma relação direta e consistente com a diminuição do risco.

Isso reforça a ideia de que o câncer de mama é uma doença multifatorial, onde fatores como genética, ambiente e estilo de vida interagem de formas complexas e individualizadas. Assim, recomendações alimentares generalizadas podem não ser eficazes para todos os subtipos da doença. 

 

Esses achados são significativos para profissionais de saúde, pois indicam que, embora certos alimentos possam ter um papel protetor, não há uma solução única na nutrição para prevenir o câncer de mama, dado seu caráter multifatorial. 

 

 

Todos esses achados apontam para o que já é amplamente recomendado: reduzir o consumo de gorduras saturadas e aumentar a ingestão de frutas, vegetais. Não é novidade que esses padrões alimentares são vistos como saudáveis e, de fato, a maioria das pessoas já tem essa percepção. Contudo, o verdadeiro desafio está na lacuna entre o que as pessoas sabem e o que elas efetivamente praticam. Mesmo com todo o conhecimento disponível, muitas pessoas não seguem esses hábitos. 

 

Ir além de repetir recomendações óbvias exige uma compreensão mais profunda do comportamento alimentar. É preciso entender por que, mesmo cientes do que é amplamente recomendado, tantas pessoas lutam para incorporar esses hábitos no dia a dia. Traçar estratégias eficazes requer uma abordagem individualizada, baseada em fatores emocionais, sociais e culturais que influenciam cada pessoa de maneira única.

Ao mesmo tempo, é crucial que as orientações sejam fundamentadas em ciência de qualidade, para evitar a propagação de desinformação ou promessas simplistas que não consideram a complexidade de condições como o câncer de mama. Em última instância, é essa combinação de compreensão do comportamento alimentar e embasamento científico sólido que permitirá criar intervenções significativas e eficazes para a saúde de todas as pessoas. 

 

Texto por Felipe Daun: nutricionista, mestre e doutor pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Aprimorando em Transtornos Alimentares pelo AMBULIM IPq-FMUSP. Professor do Instituto Nutrição Comportamental e colaborador da Academia da Nutrição. 

 

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