A fissura labiopalatina, popularmente conhecida como “lábio leporino”, é uma condição congênita que afeta milhares de bebês em todo o mundo. Essa malformação ocorre durante desenvolvimento fetal, entre a quarta e nona semana, resultando em uma abertura no lábio superior, podendo se estender até o nariz.
Como nutricionista, é interessante entender os diferentes aspectos relacionados à fissura labiopalatina para fornecer um suporte adequado e individualizado, junto a um acompanhamento multiprofissional, às famílias e aos bebês afetados por essa condição.
O que é a fissura labiopalatina? Quais os tipos?
Este tipo de fissura é uma malformação facial congênita que ocorre quando os tecidos que formam o lábio superior não se fundem adequadamente durante o desenvolvimento fetal. Essa abertura pode variar em tamanho e extensão (Figura), desde uma fenda leve até uma abertura completa que se estende até o nariz.
A fissura labial pode ocorrer isoladamente ou em combinação com uma fissura no palato, conhecida, então, como fissura labiopalatina.
Figura: Tipos de fissuras labiais e labiopalatinas de acordo com o tamanho e extensão.
Adaptado de Monlleó et al., 2014.
A fissura labiopalatina é uma das malformações congênitas mais comuns, afetando aproximadamente 1 em cada 700 a 1.000 nascidos vivos em todo o mundo. No Brasil, estima-se uma prevalência de aproximadamente 0,3% – o que em números absolutos pode representar cerca de 6000 novos casos a cada ano.
Esses dados ressaltam a importância de nutricionistas estarem preparados para lidar com essa condição junto a uma equipe multiprofissional, mas principalmente indicar o melhor caminho de cuidado, caso sejam buscados por pais e responsáveis.
Além dos nutricionistas, outros profissionais são fundamentais para este cuidado: cirurgiões plásticos, fonoaudiólogos, odontopediatras, pediatras e psicólogos.
Essa abordagem colaborativa visa fornecer suporte nutricional, intervenção cirúrgica, terapia da fala, cuidados odontológicos e apoio psicológico para garantir o desenvolvimento adequado do bebê.
Amamentação e introdução alimentar
Em bebês sem esta má formação, em um processo eficiente, é fundamental que a maior parte da aréola do seio da mãe seja abocanhada, de modo que os seios lactíferos sejam adequadamente esvaziados.
Durante a sucção, o mamilo se estende aproximadamente três vezes seu comprimento normal dentro da boca do bebê, fazendo contato com o palato duro e alcançando o palato mole, estimulando a sucção. Nesse momento, a língua realiza um movimento ondulatório chamado onda peristáltica, deslocando-se de forma anteroposterior.
Esses movimentos são realizados por uma complexa rede de cerca de vinte músculos orofaciais diferentes, resultando na liberação do leite dos seios lactíferos diretamente para a cavidade oral do bebê.
Esta breve descrição deixa claro o desafio para bebês com a fissura labiopalatina, já que o mecanismo para a sucção eficaz estará comprometido.
Como já mencionado, cada caso deverá ser avaliado individualmente por uma equipe multiprofissional – mas, em geral, este acompanhamento estará associado a algumas orientações gerais:
- O tempo de amamentação será naturalmente maior, a depender do nível de dificuldade da criança, e deve ser respeitado;
- Caso seja necessário utilizar uma mamadeira especial, a prioridade deve ser dada ao leite materno ordenhado e não às fórmulas infantis;
- O lado da fissura não deve ser evitado durante este processo, a fim de estimular a musculatura;
- Para evitar o refluxo nasal e a penetração de leite no conduto auditivo, poderá ser recomendada a amamentação na posição ereta – mas a melhor posição deverá ser indicada pela equipe multiprofissional, a depender do tipo de fissura.
- Para evitar o ganho de peso insuficiente, o uso de sonda pode ser indicado em casos mais graves.
- E tal como a amamentação, a introdução alimentar também deverá contar com cuidados especiais – considerando ainda aqui a evolução do cuidado com a fissura labiopalatina (inclusive se algum procedimento cirúrgico já foi realizado).
Recomenda-se que os alimentos sejam oferecidos em consistências adequadas à capacidade de degluti��ão da criança, evitando alimentos duros ou pegajosos que possam dificultar a alimentação. A consistência dos alimentos pode ser adaptada conforme o bebê cresce e desenvolve habilidades de mastigação e deglutição.
Da mesma forma que as recomendações para as crianças sem a fissura labiopalatina, reforça-se a importância de evitar misturas que impeçam o reconhecimento e identidade dos alimentos (as populares papinhas). Ainda que seja necessário mais tempo para este momento da alimentação, este cuidado permite um adequado desenvolvimento de preferências e relação com os alimentos.
Assim, a fissura labiopalatina representa um desafio significativo, em vários contextos.
Para nutricionistas, compreender os diferentes aspectos dessa condição permite indicar a melhor caminho para as famílias e também trabalhar em conjunto com uma equipe multiprofissional para fornecer suporte individualizado.
A amamentação e a introdução alimentar requerem cuidados especiais, adaptando-se às necessidades e capacidades de cada criança.
Ao oferecer orientações personalizadas e promover a colaboração entre os profissionais de saúde, contribui-se para o bem-estar e o desenvolvimento saudável dessas crianças, bem como para a tranquilidade dos responsáveis.
Para informações mais detalhadas, recomenda-se a leitura do Manual De Cuidados de Saúde d Alimentação da Criança com Fenda Oral, produzido pelo Projeto Crânio-Face Brasil, uma parceria da Universidade Federal do Alagoas e da Unicamp.
REFERÊNCIAS BIBIOGRÁFICAS
- Di Ninno CQMS, Gomes R, Santos P, Bueno M, Galvão D, Meira A, et al. O conhecimento dos profissionais da área da saúde sobre fissura labiopalatina. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2004;9(2):93-101.
- Di Ninno CQMS, Moura D, Raciff R, Machado SV, Rocha CMG, Norton R de C, et al.. Aleitamento materno exclusivo em bebês com fissura de lábio e/ou palato. Rev soc bras fonoaudiol. 2011 (4):417–21.
- Rocha CM. Resultados da intervenção interdisciplinar precoce em crianças com fissura labiopalatal atendidas no centro de tratamento de fissuras [dissertação]. Minas Gerais: Universidade Federal Minas Gerais; 2008.
- Schalet, Grant MD*; Langlie, Jake BS†; Kim, Minji BS†; Thaller, Seth MD, DMD, FACS‡. The Rule of 10s for Cleft Repair: A Historical Review of the Literature. The Journal of Craniofacial Surgery 34(3):p 884-887, 2023.
- Silva EB, Furia CLB, Di Ninno CQMS. Aleitamento em recém nascidos portadores de fissuras labiopalatina: dificuldade e métodos utilizados. Rev CEFAC. 2005;7(1):50-4.
- Ville APM, Staszczak L, Lopes L, Vivan JM. Os desafios e estratégias para amamentação no recém-nascido com fissura labiopalatina. Resid Pediatr. 2022;12(1):1-9 DOI: 10.25060/residpediatr-2022.v12n1-453.
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