Importância da Nutrição no Tratamento Oncológico

A nutrição desempenha um papel fundamental tanto na prevenção quanto no tratamento de inúmeras doenças crônicas, incluindo o câncer. A […]


A nutrição desempenha um papel fundamental tanto na prevenção quanto no tratamento de inúmeras doenças crônicas, incluindo o câncer. A alimentação saudável é frequentemente vista como uma estratégia preventiva, mas seu impacto vai muito além disso, especialmente quando discutimos a intervenção nutricional em pacientes oncológicos.  

Recentemente, a participação de um médico oncologista em uma live com a apresentadora Ana Maria Braga gerou polêmica, ao sugerir que a prevenção do câncer poderia ser simplificada à adoção de uma “Dieta Divina”, sem a necessidade de acompanhamento nutricional especializado.  

Esse tipo de afirmação levanta questões importantes sobre a banalização da ciência nutricional e o papel indispensável do nutricionista no manejo do câncer. O presente artigo tem como objetivo discutir a importância de uma abordagem científica na nutrição oncológica e os riscos associados à desinformação. 

A Complexidade da Nutrição Oncológica 

A nutrição, enquanto ciência, é composta por um conjunto de conhecimentos que envolvem a complexa interação dos alimentos com o corpo humano. Em situações delicadas como o câncer, o papel da alimentação vai muito além do simples consumo de alimentos naturais. Cada paciente apresenta um quadro clínico distinto, com diferentes necessidades nutricionais que variam de acordo com o tipo e estágio do câncer, o tratamento em curso e as condições de saúde pré-existentes. 

O Consenso Brasileiro de Nutrição Oncológica, publicado pela Sociedade Brasileira de Nutrição Oncológica (SBNO), destaca a relevância da nutrição para a prevenção e tratamento dos sinais e sintomas relacionados ao estado nutricional dos pacientes com câncer. A SBNO enfatiza que o suporte nutricional deve ser planejado cuidadosamente para cada fase do tratamento oncológico, desde o diagnóstico até o pós-tratamento, considerando todas as faixas etárias.  

Negligenciar o acompanhamento nutricional pode comprometer não apenas o sucesso do tratamento, mas também a qualidade de vida dos pacientes, que muitas vezes enfrentam complicações como perda de peso, desnutrição e fadiga extrema. 

Os Perigos das Recomendações Simplistas 

Entretanto, a mensagem passada pelo oncologista na live pode sugerir que a simples adesão a uma alimentação baseada em alimentos in natura seja suficiente para todos os pacientes. Tal generalização é perigosa, pois ignora as particularidades de cada indivíduo e a importância de uma abordagem nutricional baseada em evidências científicas.  

Para um paciente oncológico, o acompanhamento nutricional é indispensável para assegurar que a dieta ofereça os nutrientes necessários para sustentar o corpo durante tratamentos agressivos, como a quimioterapia e a radioterapia, que frequentemente causam efeitos colaterais severos. 

A exclusão de alimentos processados, mencionada como parte da “Dieta Divina”, também é uma recomendação importante, já que o consumo excessivo de ultraprocessados está associado ao aumento do risco de diversas doenças crônicas, incluindo o câncer.  

No entanto, como enfatizado no Guia Alimentar para a População Brasileira, a alimentação saudável não se limita apenas a evitar produtos processados. Deve-se considerar a qualidade dos alimentos, o modo de preparo e como são consumidos, além dos aspectos sociais, culturais e econômicos que influenciam os hábitos alimentares. 

A Importância do Acompanhamento Nutricional Personalizado 

Uma abordagem simplista pode ainda desvalorizar o papel do nutricionista, profissional especializado em adaptar o plano alimentar às necessidades individuais de cada paciente. O nutricionista avalia o histórico clínico e as condições de saúde, além de ajustar a alimentação para melhorar os resultados do tratamento e minimizar os efeitos adversos.  

Estudos científicos comprovam que uma intervenção nutricional adequada pode ajudar na manutenção da força e da massa muscular, reduzir o risco de complicações e melhorar a resposta aos tratamentos oncológicos. Uma revisão publicada no Journal of Oncology destaca que a nutrição adequada, combinada com o tratamento oncológico, pode preservar a massa muscular e melhorar o estado geral dos pacientes (Argilés et al., 2020).  

Além disso, pacientes que mantêm uma nutrição equilibrada têm menor risco de complicações, como desnutrição e sarcopenia, segundo Prado et al. (2018). Declarações como as feitas na live podem subestimar a importância da ciência nutricional, ao sugerir que uma alimentação baseada apenas no que “Deus fez” seja suficiente para todos.  

O papel do nutricionista, conforme descrito nas diretrizes da American Cancer Society, vai muito além de recomendar alimentos saudáveis, envolvendo a aplicação de conhecimentos científicos para garantir que o plano alimentar seja adequado às necessidades específicas de cada paciente, inclusive em casos de efeitos colaterais ou complicações graves (Rock et al., 2020). 

A nutrição oncológica não pode ser tratada de forma simplista. Embora o consumo de alimentos in natura seja importante, ele deve ser parte de uma estratégia mais ampla, baseada em evidências científicas e adaptada às necessidades individuais de cada paciente.  

A intervenção nutricional realizada por nutricionistas capacitados é essencial para garantir o sucesso do tratamento e a qualidade de vida dos pacientes com câncer. Simplificar essa discussão pode desvalorizar o trabalho desses profissionais e comprometer o cuidado integral dos pacientes.  

Assim, é imperativo que a sociedade valorize e entenda o papel crucial da nutrição baseada na ciência no tratamento oncológico, promovendo uma abordagem integrada e personalizada. 

  • Referências bibliográficas: 
     
    Argilés et al., 2020: ARGILÉS, Josep M.; ANTOINE, Emmanuelle; AVELLANEDA, Angela; BOS, Christophe. Cancer-associated malnutrition and sarcopenia in elderly patients: a narrative review. Journal of Oncology, v. 29, n. 3, p. 345-354, 2020. 
  • Prado et al., 2018: PRADO, C. M.; ANTONIERO, T.; SOUZA, R. D. C.; SAHLAS, D. J. Effect of protein supplementation on the incidence of sarcopenia in cancer patients undergoing chemotherapy. Journal of Clinical Oncology, v. 36, n. 5, p. 112-120, 2018. 
  • Rock et al., 2020: ROCK, Cheryl L.; THOMSON, Cynthia; GANSLER, Ted. American Cancer Society Guidelines on Nutrition and Physical Activity for Cancer Survivors. CA: A Cancer Journal for Clinicians, v. 70, n. 4, p. 245-271, 2020. 
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