Nos últimos anos, a microbiota intestinal tem sido objeto crescente de pesquisa e de interesse da população. A relação e importância do bom funcionamento do intestino para a saúde do organismo como um todo é principalmente associada por conta da interação com o sistema imunológico e a saúde mental.
O relatório de tendências em alimentação saudável de 2021 da Mintel aponta que 57% dos brasileiros acreditam que uma boa digestão impacta na saúde emocional. Além disso, através do PubMed, uma das maiores plataformas de publicação científica, é possível identificar o aumento progressivo no número de estudos que associam a saúde intestinal à melhora da imunidade.
A microbiota intestinal desempenha uma série de funções cruciais para a saúde, que envolvem desde a fermentação de substratos não digeríveis, a síntese de vitaminas e de metabólitos bioativos, até a modulação de respostas imunológicas e inflamatórias. Assim, a microbiota intestinal saudável e equilibrada está relacionada a melhora da resposta inflamatória, aumento da absorção intestinal de nutrientes, menor perda de água, sais e eletrólitos e melhor desempenho do sistema imunológico.
Em contrapartida, qualquer alteração na composição das bactérias da microbiota pode alterar esse balanço, favorecendo a inflamação e reduzindo a absorção de nutrientes. Todos esses fatores somados levam à disbiose, ou seja, comprometem o equilíbrio e a saúde do indivíduo.
Nesse contexto, para manter a microbiota intestinal equilibrada e saudável, as fibras e probióticos ganham cada vez mais destaque pela influência que exercem na manutenção das bactérias benéficas e, portanto, da saúde intestinal.
O papel das fibras na saúde intestinal
Encontradas em alimentos de origem vegetal, como frutas, vegetais, legumes, grãos integrais e sementes, as fibras alimentares são constituídas de partes não digeríveis, como celulose, pectina e lignina, resistentes às enzimas de digestão e à absorção do trato gastrointestinal e são classificadas em solúveis e insolúveis.
As fibras solúveis, também chamadas de prebióticas, têm a capacidade de se dissolverem em água, o que acarreta a formação de um gel que permanece no sistema digestivo por um período prolongado e, consequentemente, promove uma sensação duradoura de saciedade.
A partir dessas fibras, as bactérias benéficas residentes na microbiota intestinal realizam a fermentação, resultando na produção de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC). Esses componentes formados promovem efeitos variados que contribuem para a saúde intestinal, como a manutenção da barreira do intestino, a modulação do sistema imunológico e a diminuição do pH tanto no ambiente intracelular quanto no cólon, inibindo a proliferação de organismos patogênicos e a formação de produtos de degradação tóxicos. Além de impactarem na microbiota intestinal, os AGCCs exercem forte influência na redução da prevalência de doenças cardiovasculares, hipertensão arterial, obesidade e diabetes tipo 2.
Alguns exemplos de fibras solúveis mais conhecidas são a inulina, a polidextrose, e o psyllium, responsáveis por estimular o trânsito intestinal, e as frutooligossacarídeos (FOS), que auxiliam na produção de bactérias benéficas.
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Fonte: MARQUES, 2020.
Já as fibras insolúveis não são capazes de se dissolver em água. Sua principal função está associada com a facilitação do trânsito intestinal e atenuação da constipação. Através do desencadeamento de estímulos mecânicos na mucosa intestinal, ocorre a secreção de água e muco que aumentam o volume fecal e a velocidade no movimento intestinal. Como resultado, a passagem das fezes pelo intestino se torna mais eficiente e suave, aliviando a possibilidade de constipação e desconfortos associados.
O papel dos probióticos na saúde intestinal
Para além da inclusão de fibras na alimentação, os probióticos, microrganismos vivos que conferem benefícios à saúde intestinal dos indivíduos, também representam uma grande importância na manutenção e regulação da microbiota intestinal, quando suplementados de forma correta.
Para proporcionar benefícios, agem por meio de diversas vias, como a estimulação dos mecanismos imunológicos da mucosa, interações com microrganismos comensais e potencialmente patogênicos, produção de produtos metabólicos como os AGCCs e comunicação com células do hospedeiro por meio de sinais químicos. Esses mecanismos resultam em efeitos positivos, como a inibição de patógenos, a melhoria do ambiente intestinal, o fortalecimento da barreira intestinal, a regulação da inflamação e o reforço da resposta imunológica a desafios antigênicos.
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Fonte: ALMEIDA, 2009.
Os probióticos se dividem em cepas conforme o gênero, a espécie e a linhagem , sendo os gêneros mais utilizados os Lactobacillus e os Bifidobacterium. As Bifidobacterium apresentam resultados positivos na estimulação do sistema imunológico, produção de vitamina B, inibição da multiplicação de patógenos e no auxílio para reestabelecer a microbiota normal após o tratamento com antimicrobianos. Enquanto isso, os Lactobacillus são capazes de fermentar carboidratos, produzindo ácido lático, a enzima lactase e, também, protegendo contra o acesso e a proliferação de microrganismos patogênicos.
É interessante ressaltar que estudos recentes e as Diretrizes mundiais de Gastroenterologia apontam que os benefícios dos probióticos não estão diretamente ligados à quantidade e variedade de cepas, mas sim à atuação específica de cada uma delas. Dessa forma, considerando a atuação ampla e complementar dos gêneros Lactobacillus e Bifidobacterium, ambas são essenciais para garantir a saúde intestinal nos mais diversos casso clínicos.
Como utilizar as fibras e probióticos na prática clínica?
A incorporação adequada de fibras e probióticos na dieta pode ser uma estratégia valiosa para promover a saúde intestinal e, por extensão, contribuir para a saúde geral do paciente.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a recomendação diária de fibras para um adulto é de 25 a 30 gramas. Mas, você sabia que a média de ingestão da população brasileira é de apenas 15,6 gramas/dia, segundo a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF, 2017-2018)? As fibras solúveis são encontradas, principalmente, na aveia, no morango, na lentilha, no feijão e outras frutas, verduras e legumes, mas, considerando o padrão alimentar e a rotina corrida dos pacientes, suplementos alimentares de fibras são ideais para manter o aporte adequado de forma prática.
Recentemente, dados da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL, 2006-2021) mostram que das 27 capitais do Brasil, o consumo regular de 5 ou mais dias na semana de frutas e hortaliças encontra-se entre 33 e 34%. Por sua vez, a recomendação diária de 400g para frutas e hortaliças, equivalente a 5 porções desses alimentos, segundo a OMS, é atingida apenas em 20 a 22% para todas as idades e níveis de escolaridade. Além disso, observou-se redução no consumo de feijão (alimento riquíssimo em fibra) ao longo dos anos em cerca de 6%, corroborando com o baixo consumo de fibras na população brasileira.
No caso dos probióticos, valorize a indicação após tratamentos com antibióticos, distúrbios gastrointestinais ou situações de imunidade comprometida. Indivíduos com condições como síndrome do intestino irritável, doença inflamatória intestinal ou até questões relacionadas à saúde mental também podem se beneficiar com a inclusão de probióticos na terapia nutricional.
Dessa forma, garantir o aporte adequado de fibras diariamente e incluir probióticos na rotina nutricional dos pacientes é essencial para beneficiar a saúde da microbiota intestinal e promover uma cascata de benefícios fisiológicos e metabólicos para maior longevidade e qualidade de vida dos pacientes!
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REFERÊNCIAS
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ALMEIDA LB, et al. Disbiose intestinal. Revista Brasileira de Nutrição Clínica. São Paulo, v. 24, n. 1, p. 58-65, dez. 2009.
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